A série “Giro Ancestral” está de volta ao Carnavalize para mergulhar na encantadora arte de mestre-sala e porta-bandeira. Na primeira temporada, abordamos vários temas que envolvem essa linda dança, desde o seu surgimento, a importância do quesito para uma agremiação e para o Carnaval, os movimentos obrigatórios, a análise de julgamento em São Paulo e Rio de Janeiro, casais com as parcerias mais longínquas e a nova geração de porta-bandeiras. A segunda temporada acontecerá todas as segunda-feiras do mês de novembro no site, na qual destrinchamos um pouco mais sobre essa nobre arte. Nas redes sociais e no canal do Carnavalize no YouTube, você pode conferir conteúdos exclusivos dedicados à memória e estudos dos casais.
“Quero ser a pioneira / A erguer minha bandeira / E plantar minha raiz”
Se nem os dedos das mãos são todos iguais, as escolas de samba também não são, obviamente, nem pelo todo, nem pelas partes que as compõem, apesar de estarem reunidas por características comuns. Um detalhe que quase passa despercebido pelos olhares dos foliões não é a bandeira em si. Sobre ela, muitos sabem as cores, quantas estrelas estão bordadas e quais símbolos nela são representados.
Como a sutileza mora ao lado, nossos holofotes hoje se viram para os mastros, os instrumentos de sustentação e condução dos pavilhões. Em definição vulgar, mastro nada mais é do que o famoso “pau da bandeira”. É nele que as porta-bandeiras entrelaçam seus braços e repousam suas mãos para a condução dos pavilhões. Não há tamanho determinado: cada uma escolhe o que julga ser melhor para uma boa condução, sempre levando em consideração o conforto na dança.
Hoje, a maioria das porta-bandeiras opta pelo mastro médio. Originalmente, mede 1,90m, mas muitas delas pedem que eles sejam cortados e adaptados ao tamanho que melhor lhes convêm executar o bailado. Proporcionalmente ao tamanho da bandeira, quando se usa mastro médio, a mão chega a encostar levemente no pavilhão, o que permite alguns truques para que esteja ao alcance de suas guardiãs intervir, caso os ventos possam oferecer risco ao desfraldar da bandeira.
Bruna Santos, porta-bandeira da Mocidade Independente de Padre Miguel, tem à altura de sua mão direita o tecido da bandeira para segurar o mastro. Com essa forma, é possível intervir, dependendo do imprevisto com o pavilhão. Foto: Vitor Melo
Lendárias porta-bandeiras, como Vilma Nascimento e Maria Helena, foram adeptas dos mastros mais baixos, ainda que suas bandeiras fossem maiores do que as que vemos hoje. A altura do mastro estará de acordo com o tamanho da bandeira – e da porta-bandeira – por uma simples razão: é impossível pensar em um mastro médio com bandeira grande para uma porta-bandeira de baixa estatura. O pavilhão certamente enrolará ou poderá ser facilmente agarrado pelo adereço de cabeça dela ou de seu mestre-sala.
Vilma Nascimento, apesar de dançar com um pavilhão grande, já dançou com o mastro mais baixo.
Foto: Paulo Namorado
Foto: Paulo Namorado
O inverso é possível, no entanto: muito se vê mastros com bandeiras menores, passando a falsa impressão de que eles são altos quando, na verdade, os pavilhões têm dimensões menores. O mastro alto, portanto, será aquele que ostenta o pavilhão em um nível ainda maior que o convencional, no qual é quase impossível que a porta-bandeira toque o tecido com as pontas dos dedos ou possa intervir manualmente, de forma disfarçada, na ocorrência de uma ventania, a menos que tenha uma bandeira imensa e que preencha a distância entre o fim da amarração do pavilhão e a posição de sua mão. Vilma Nascimento também é um exemplo desse tipo e, segundo a própria, foi ela a responsável por criar o hábito de dançar com o pavilhão nas alturas.
De determinada época para frente, tomando como ponto inicial a década de 1970, Vilma já aparece dançando com um mastro muito mais alto, sem qualquer proximidade da mão com o tecido da bandeira, que seguia grande.
Foto: Reprodução/Internet
Hoje, é difícil identificar esse tal mastro alto marcando presença, mas a lição parece ter sido aprendida por algumas porta-bandeiras, principalmente por Giovanna Justo, referência da categoria. Até o último Carnaval, ela era representante solo de um mastro enorme e, até pouco tempo atrás, foi acompanhada por Jaçanã Ribeiro. A beleza de ostentar um pavilhão em mastro alto está em perceber que o símbolo maior da escola de samba estará girando, manifestando o movimento da vida sobre a linha do tapete da escola que vem atrás. Giovanna diz que aprendeu a usar o mastro a essa altura na ala mirim da Mangueira, escola pela qual desfilou como primeira porta-bandeira por quinze carnavais, e segue dançando assim até hoje. Débora, atual segunda porta-bandeira da verde-e-rosa, carrega a mesma característica. Aquele é um território que preza por mostrar ao mundo suas cores, símbolos e anunciar sua chegada. Em São Paulo, é Paulinha Penteado, digna de todos os olhares e aplausos, que põe o pavilhão negro do Vai-Vai para girar perto das nuvens.
Há mais de vinte anos, Giovanna Justo ostenta um pavilhão carregado nas alturas por um mastro alto. Assim, é possível vê-lo girar livre e acima de todo o tapete de componentes da escola. Paulinha Penteado, em São Paulo, ostenta o belo pavilhão do Vai-Vai junto ao céu. Fotos: Wigder Frota e Levi Bianco
Na ventania, é consideravelmente mais difícil ter controle do pavilhão no mastro alto do que no baixo, já que a mão não consegue auxiliar de forma alguma em uma escalada em busca do tecido para fazer pressão sobre ele. O segredo parece ser não brigar contra o vento, mas senti-lo para deixar que o movimento do braço possa encontrar a melhor saída.
Para encerrar: mastro alto ou baixo não significa mais ou menos técnica. Há porta-bandeiras adeptas dos dois tipos e igualmente premiadas. Fato é que dá uma emoção danada ver um pavilhão beijando o céu para dizer quem chegou, marcando sua identidade e territorialidade na gira dos giros que dão forma e movimento à vida.