#SÉRIEDECADA: os 10 desfiles mais marcantes da Série A do carnaval carioca

por Beatriz Freire e Leonardo Antan
Revisão: Felipe Tinoco
Artes e visual: Vitor Melo
O Carnavalize está de volta a pleno vapor! Após um breve descanso e uma diminuição de ritmo, nossa produção de conteúdo retorna com um quadro que estávamos super ansiosos para fazer: a #SérieDécada! A segunda década desse século, iniciada em 2011 e finalizada no carnaval que acabou de terminar em 2020, trouxe muitas reviravoltas e transformações para a folia! Para traçar um panorama de tudo que aconteceu nestes últimos anos, tem texto novo todas as segundas, quartas e sextas-feiras.
Além disso, nos dias seguintes às divulgações dos textos – ou seja, terças, quintas e sábados – um podcast especial será lançado com nossos comentários em áudio sobre os desfiles, os bastidores das escolhas, e as nossa divergências de opiniões!

Como é impossível fazer uma seleção que agrade não só às leitoras e aos leitores, como também aos integrantes do Carnavalize de forma unânime, cada categoria também contará com menções honrosas que por pouquíssimo não entraram no ranking principal.
No texto de hoje, falaremos das escolas do segundo grupo da Marquês de Sapucaí. O Acesso passou por uma forte transformação durante a década, após uma série de polêmicas nos resultados dos carnavais da Lesga. Recém-criada em 2009, a nova liga para gerir as apresentações durou apenas quatro anos. Em 2013, um novo formato surgiu com a fundação de outra liga, a Lierj, e a junção os antigos grupos A e B em apenas um: a Série A. Até então, ela conta com dois dias de desfiles, transmitidos pela TV Globo. No último ano, outros acontecimentos políticos também movimentaram o liga da Série A e as escolas envolvidas, com direito ao surgimento de outros coletivos.

Inicialmente com o número de 19 escolas integrantes, a desregularidade entre as agremiações da Série A foi forte. Com o aperfeiçoamento do grupo ao longo da década, essa impressão foi se amenizando. Vale lembrar que, das grandes missões do grupo de acesso, a de impulsionar novos talentos e personalidades aconteceu em diversos segmentos: carnavalescos, casais, coreógrafos. Dessa forma, algumas apresentações históricas aconteceram.

Então chega de papo e vamos conferir o segundo #TOP10 da #SérieDécada: os desfiles mais marcantes do Acesso carioca. (A gente lembra sempre que a lista é escrita SEM ordem hierárquica, disposta de forma livre, e não em forma de ranking.)

Ps.: se quiser ver lindas fotos de cada um dos desfiles, clique nas primeiras palavras de suas análises. Com exceção do ano 2016, que não possui álbum, todos os outros desfiles possuem fotos, disponibilizadas pela Riotour sejam em álbuns individuais, sejam em uma galeria compartilhada do dia de desfiles.


Império Serrano 2012 
(Dona Ivone Lara: o enredo do meu samba)

Lindos acontecimentos do carnaval, e futuras belas memórias, ocorrem quando uma escola valoriza sua própria história na figura de algum de seus principais baluartes. E se tratando de Império Serrano, a verde e branco não deve nada em personalidades icônicas. Naquele ano, a rainha Dona Ivone Lara completava 90 anos em plena atividade. Para sorte dos sambistas a Serrinha escolheu a simbólica data para materializar a homenagem a uma de suas principais torcedoras. No bastidores, a agremiação passava por mais uma de suas eleições conturbadas. Desta vez, o ex-mestre de bateria da escola Átila assumiu a presidência no pré-carnaval prometendo retornar às origens da histórica agremiação. 

A Dama do Samba, Ivone Lara, no desfile imperiano em sua homenagem. Foto: Raphael David/Riotour

Para comandar a parte visual, o já consolidado Mauro Quintaes foi contratado, e para criar um clássico musical necessário para esta compositora histórica, ninguém menos que uma parceria liderada por um outro sambista de peso: Arlindo Cruz. Ele assinou o samba ao  lado de Arlindo Neto e Tico do Império e a obra foi conduzida na avenida por Freddy Vianna e Tiãozinho Cruz. Sua letra traduziu com a delicadeza e beleza a vida da homenageada, passeando por sua herança ancestral africana, sua ligação com Heitor Villa-Lobos, sua obra musical e o clássico hino “Os cinco bailes da história do Rio de Janeiro”. Com problemas estruturais nos bastidores da folia, a plástica da apresentação se mostrou mais singela, mas a Serrinha não ficou devendo em emoção. A alegoria mais bonita da apresentação foi justamente a que veio a homenageada, lembrando o desfile imperiano Mãe Baiana Mãe, de 1983. Outro trunfo da Serrinha foi a experiência de Carlinhos de Jesus no comando da Comissão de Frente. Mesmo com a apresentação mais emocionante do grupo, o Império terminou em 2º lugar e ficou atrás da Inocentes de Belford Roxo. Os boatos de manipulação do resultado foram fortes e aquele ano marcou a última apresentação do acesso comandada pela LESGA. 

Império da Tijuca 2013 
(Negra, pérola mulher)

No primeiro ano do atual formato do Acesso, foi com uma dose de favoritismo – devido à competência do trabalho impecável de um ano inteiro – que o Império da Tijuca encerrou os trabalhos inaugurais da Série A. O desfile marcou a estreia do carnavalesco Júnior Pernambucano pelo carnaval carioca, e foi apenas o início de um casamento com a escola da Formiga que durou cinco anos. Em reverência e exaltação às mulheres pretas, a escola desfilou toda a ancestralidade e legado de guerreiras, rainhas, quilombolas e artistas. A ideia principal do desfile era exaltar estas mil facetas de mulheres que protagonizaram suas próprias histórias, investidas no papel de representantes da força criadora e transformadora de todas as coisas. 

Visão panorâmica do belo desfile do Império da Tijuca no carnaval 2013. Foto: Raphael David/Riotour
O samba-enredo da turma de Samir Trindade embalou as grandes expectativas que se tinha para aquela noite, já que era considerado por muitos como o grande destaque da safra. A linha de início foi cruzada pelas mulheres da comissão de frente de Junior Scapin, representando as feiticeiras em culto à Eleyé. As vestes em tons escuros e saias alaranjadas contrastavam lindamente com a enorme entidade de asas pretas, figura central do grupo, em uma fortíssima apresentação que emanou muito axé na abertura da passagem do Imperinho. Esteticamente, o conjunto assinado por Pernambucano tinha lindas soluções de fantasias e alegorias. Um imponente trio de rostos trazia mulheres em cima de cada um deles e foi uma das imagens mais marcantes e, por que não?, simbólicas da apresentação da escola. Todo a força da aura feminina conduziu uma passagem sem defeitos da escola, que homenageou até Xica da Silva à frente dos ritmistas da Sinfonia Imperial. Com tamanha emoção, não tinha como ser diferente: a escola foi campeã com a pontuação máxima dos quesitos e entrou para a história dos grandes carnavais do Acesso.

Viradouro 2014 
(Sou a Terra de Ismael, ‘Guanabaran’ eu vou cruzar… Pra você tiro o chapéu, Rio eu vim te abraçar)

Niterói já foi capital estadual e não fica para trás quando o assunto é excelência no mundo do samba. A competência do município se reflete não apenas nos desfiles das agremiações de origem na cidade, como também já foi enredo. Orgulhosamente, a Viradouro contou a história de sua região natal em um carnaval desenvolvido pelo jovem carnavalesco João Vitor Araújo. Ele estreou no posto após assessorar o trabalho de Max Lopes na vermelho e branco no anterior.

Início do desfile da vermelho e branco de Niterói em 2014. Foto: Gabriel Santos/Riotour
Já na comissão de frente, coreografada por Luciana Yegros, era trazida a imagem de Araribóia, o chefe dos temiminós, que ajudou os portugueses na conquista da Baía de Guanabara na disputa contra tamoios e franceses. Como recompensa, a terra logo próxima lhe foi dada – hoje chamada de Niterói. Dali pra frente, o desfile seguiu pela história da Cidade Sorriso, em conexões por diversos momentos com o próprio Rio de Janeiro, sua cidade vizinha. Mesmo que João Vitor ainda estivesse em fase inicial de sua construção como artista da festa, a agremiação apresentou um conjunto alegórico e de fantasias para nenhum carnavalesco experiente – tampouco o júri – colocar defeito. E se o visual brilhou, o que dizer do chão da escola? Na icônica paradinha de Mestre Pablo, dava para se escutar “canta, Viradouro!”, como gritavam os componentes, do outro lado da ponte. O orgulho de contar a história de seu chão transcendeu os limites físicos da Sapucaí e foi coroado com a conquista do tão sonhado campeonato da alvirrubra, que conquistou o direito de retornar ao Grupo Especial.

Unidos de Padre Miguel 2015 
(O Cavaleiro Armorial mandacariza o carnaval)

Uma das escolas que mais se destacou após a criação da Série A, a Unidos de Padre Miguel começou a mostrar sua envergadura no primeiro ano do novo formato ao trazer um enredo africano que mostrou a força do chão da Zona Oeste. No ano seguinte, em 2014, a vermelho e branco mais uma vez surpreendeu o público com seu carnaval grandioso e o belo trabalho estético de Edson Pereira no tema sobre charadas. Ainda distante dos primeiros lugar até então, a vermelho e branco mostrou que já estava pronta para sua consolidação definitiva em 2015, em um desfile que confirmou a sinergia desse casamento tão marcante da década.  

Clique da torre fotográfica da Sapucaí do carnaval da Unidos de Padre Miguel no carnaval 2015. Foto: Alexandre Macieira/Riotour
No enredo em homenagem ao movimento armorial, simbolizado pela figura de Ariano Suassuna, Edson confirmou todas as características que se fixaram no imaginário popular de sua estética: o luxo, as grandiosas esculturas articuladas e o apuro estético aplicados em belas fantasias e alegorias. Com uma grande atuação, o intérprete Marquinhos Art’Samba defendeu muito bem o simpático samba-enredo da escola, cantado a plenos pulmões pela comunidade de Padre Miguel. Ainda assim, mesmo com tantas qualidades, o desfile não foi considerado o campeão pelo júri, faturando o vice-campeonato após ficar apenas três décimos atrás da Estácio de Sá.

Paraíso do Tuiuti 2016 
(A farra do boi)

E falando em casamento entre agremiação e escola que marcou a década, saímos da Zona Oeste em direção a São Cristóvão para lembrar de outra parceria para lá de frutífera. Depois de alguns desfiles nem tão expressivos, a Paraíso da Tuiuti surpreendeu em 2015 ao trazer um enredo divertido e inventivo do carnavalesco Jack Vasconcelos sobre a obra de Hans Staden. Depois da 5ª posição alcançada, a parceria seguiu para mais um carnaval. Com a liberdade que precisava para desenvolver seus temas na escola, Jack mostrava sua maturidade artística naqueles carnavais depois de quase dez anos em atividade.

A deslumbrante apresentação da Tuiuti, assinada por Jack Vasconcelos. Foto: Wigder Frota


O enredo escolhido para 2016 já trazia a crítica e a irreverência que ficariam marcados entre o casamento dos dois para os próximos anos. Em “A Farra do Boi”, uma fábula nordestina sobre a história do Boi Mansinho, o artista falou da comercialização da fé de modo bem-humorado e cheio de brasilidade. O desfile começou com uma abertura negra impactante, com uma excelente comissão coreografada por Junior Scapin. O casal de irmãos Vinícius e Jackeline Pessanha também brilhou logo na cabeça da amarela e azul, trajando um figurino ousado e uma maquiagem arrepiante. O único senão do ótimo trabalho estético foi o curto nas duas primeiras alegorias que desfilaram sem iluminação, mas o que em nada prejudicou o conjunto geral. Para fechar o time campeão, a bateria SuperSom garantiu mais uma vez a nota máximo sob a batuta do mestre Ricardinho. Tanta qualidade técnica teve apenas um resultado possível: um título que ganhou todos os dez possíveis na apuração e fechou em impressionantes 270 pontos, garantindo a vaga no especial que o Tuiuti ocupa até hoje.  

Unidos de Padre Miguel 2017 
(Ossain: o poder da cura)

Primeiro ano da gestão do prefeito-bispo, inimigo declarado das escolas de samba, 2017 foi uma temporada marcada por aflições inimagináveis vividas dentro e fora da pista da Marquês de Sapucaí. A Unidos de Padre Miguel, sempre favorita na Série A pelos seus ótimos desfiles, preparou o enredo “Ossain: o poder da cura”, desenvolvido pelo carnavalesco Edson Pereira. Com um samba elogiadíssimo e muito bem defendido por Pixulé, por mais um ano muito se aguardou a passagem da agremiação da Vila Vintém. 

O impactante abre-alas da escola no carnaval 2017. Foto: Fernando Grilli/Riotour
Aparentemente, a agremiação estava pronta para ascender ao Especial. O samba empolgava seus componentes e a escola pulsava, enquanto se via um arrebatador espetáculo visual. Após alguns minutos de desfile, a porta-bandeira Jéssica, durante sua apresentação, tropeçou e torceu o joelho. Rapidamente auxiliada pelo apoio da escola e pelo seu mestre-sala, Vinícius, a porta-bandeira se viu fisicamente impedida de continuar o desfile. Em um clima de tensão, Cássia, segunda porta-bandeira da escola, foi levada à frente das alas para se apresentar ao lado de Vinícius. A espera do mestre-sala, até que a substituição fosse feita, rendeu uma das imagens mais fortes daquele carnaval: sozinho, portou e protegeu seu pavilhão em posição de reverência, sem sua porta-bandeira. À época, o historiador Luiz Antônio Simas lembrou que, em alguns poemas de Ifá, Ossain é o orixá que tem apenas uma perna. Coincidência?

Vinicius segurando o pavilhão da escola após recém-lesão de sua porta-bandeira. Foto: Gabriel Monteiro/Riotour
Apesar de terem seguido firmes e cumprido muitíssimo bem seus deveres, a queda do casal ocorreu diante do módulo duplo, que ficava no Setor 6, gerando doloridos decréscimos. Além disso, a evolução da escola também acabou prejudicada. O desfile seguiu e a exuberância visual da UPM saltou aos olhos: todos os carros contaram com grandiosas esculturas articuladas e riqueza de detalhes cenográficos. As fantasias traziam uma sequência de orixás e a realização delas foi outro ponto alto da apresentação. Uma das primeiras alas trazia o iroko, com a árvore-orixá como elemento cenográfico, enredo da escola para o carnaval 2021. Ao fim daquela quarta de cinzas, a agremiação não ganhou o título, apenas um 5º lugar e um digno Estandarte de Ouro de melhor escola. Ainda que o resultado tenha sido justo, se o título não veio, novamente frustrando as expectativas do público, a UPM já tinha conquistado as páginas da história do carnaval com um desfile pulsante e inesquecível. 

Império Serrano 2017 
(Meu quintal é maior que o mundo)

Em seu oitavo carnaval longe do Grupo Especial, o Império Serrano vinha de bons resultados, com exceção de 2014, mas não conseguia desencantar. Em 2017, depois de duas boas apresentações assinados por Severo Luzardo, a escola apostou no jovem carnavalesco Marcus Ferreira para desenvolver uma homenagem à vida e à obra de ninguém menos que o poeta Manoel de Barros. A abertura da escola com um abre-alas metade dourado, metade barroso, fazendo alusão ao Eldorado e ao Pantanal, foi uma belíssima primeira imagem de desfile. Ela trazia uma escultura segurando a coroa, símbolo maior da Serrinha, e foi o ponto de partida para um conjunto alegórico de ótimo nível.

O inexorável símbolo do Império Serrano: a coroa imperial. Foto: Paula Portilho/Riotour
Ainda que pudesse haver discussão sobre ser ou não o melhor samba do ano, a letra e melodia entoadas pela Serrinha tinham versos inspirados que propiciaram um canto orgulhoso dos componentes e das arquibancadas. Um dos grandes destaques daquela apresentação, vale ressaltar, foi o casal de mestre-sala e porta-bandeira, formado por Feliciano Junior e Raphaela Caboclo. Em vestes sem as tradicionais penas utilizadas, mas feitas de capim seco, os dois jovens e experientes talentos representavam o índio e a perdiz, personagens de “O primeiro poema” – curiosamente o último poema do livro “Menino do mato” de autoria do homenageado. Como o que não podia faltar era a aura da poesia, o Império Serrano foi catártico e fez uma excelente apresentação. “Pelo toque do agogô”, já sabíamos que a possibilidade de gritar “é campeã” na quarta-feira era grande. Não deu outra: no seu 70° ano de vida, o Menino de 47 soltou o grito entalado e explodiu Madureira, já que a Portela também havia conquistado o caneco do Grupo Especial naquela tarde. 

Unidos do Viradouro 2018 
(Vira a cabeça, pira o coração – Loucos, gênios da criação)

Unidos da Expectativa poderia substituir muito bem o nome da Viradouro em 2018 até os últimos segundos antes do desfile. No ano anterior, a escola ganhou uma injeção de dinheiro a pouquíssimos dias do desfile desenvolvido por Jorge Silveira, que terminou com o vice-campeonato. Para o carnaval em questão, depois da chegada da família Calil à gestão da agremiação e de todo um planejamento de reestruturação, a Viradouro possuía boas credenciais no pré-carnaval. Com o enredo sobre figuras geniais, Edson Pereira tinha a missão de fazer jus e representar muito bem os versos do samba que diziam “sou Viradouro, sou paixão”, em alusão a um famoso samba de outros carnavais. 

O imponente abre-alas da escola foi uma das marcas da grandiosidade daquele desfile. Foto: Raphael David/Riotour
O orgulho de ser viradourense, naquele momento, significava tanto a força da comunidade em abraçar a escola e os feitos de sua diretoria quanto a demonstração a todo o público de que o projeto da Viradouro era a aliança entre uma boa administração e uma comunidade forte que rasgava a pista. Com um barracão adiantadíssimo e grandioso, a agremiação pisou forte na Marquês para contar as invencionices e loucuras de grandes mentes criadoras da humanidade, e apresentou um carnaval de alto nível. Longe de ser uma obra-prima, mas contagiante, o samba foi fortemente comunicado pela sempre ativa comunidade da escola, muitíssimo identificada com o intérprete Zé Paulo Sierra. Começou aí o primeiro dos grandes passos da Viradouro na história recente dos desfiles: deu Niterói nas cabeças e a escola foi consagrada a grande campeã da Série A naquele ano. A apresentação marca a retomada da vermelho e branco de maneira poderosa que a levou para o título conquistado esse ano no grupo Especial. 

Acadêmicos do Cubango 2018 
(O rei que bordou o mundo)

Resgata, Cubango! Depois de brigar fortemente pelo título do Acesso no início da década, a verde e branco de Niterói acabou patinando entre desfiles menos impactantes nos anos seguintes. Com uma apresentação problemática em 2017, a má-fase gerou uma eleição agitada no pré-carnaval para o ano seguinte. A chapa Resgata Cubango fez forte oposição ao grupo liderado pelo então presidente Pelé, o qual acabou deixando o comando da escola após quatorze anos. Rei morto, rei posto. A nova direção decidiu apostar em uma dupla de estreantes na Sapucaí: Leonardo Bora e Gabriel Haddad. Eles tinham dado o título da Série B de 2016 para a vizinha Acadêmicos do Sossego.

A história de Bispo do Rosário foi contada de forma espetacular pela dupla de carnavalescos. Foto: Gabriel Monteiro/Riotour
Após a especulação sobre um enredo acerca da cidade de Nova Friburgo, a dupla conseguiu propor um tema sobre Arthur Bispo do Rosário, dialogando com a tradição de enredos negros da agremiação. A inovação se dava ao exaltar uma personalidade pouco conhecida no senso comum, ainda que badalada no circuito das artes visuais. Embalados por um ótimo samba-enredo que captou da linha poética do enredo, os estreantes conseguiram carnavalizar de modo brilhante a estética do homenageado. As alegorias e fantasias não mostraram uma simples cópia de suas obras, mas reinventaram-nas na linguagem carnavalesca. Com momentos emocionantes, o destaque vai para a última alegoria do desfile, que trouxe uma reprodução gigantesca e artesanal do Manto de Apresentação, uma das obras mais marcantes de Bispo do Rosário, criada pelo artista para seu encontro com o criador. A apresentação marcou o renascimento da escola de Niterói e o talento de Leonardo e Gabriel, numa estreia brilhante. O desfile acabou no 5º lugar do grupo, após apresentação canetada em harmonia e evolução. 

Imperatriz Leopoldinense 2020 
(Só dá Lalá)

Após uma apresentação complexa em 2019, a Imperatriz surpreendentemente compôs a dupla de escolas rebaixada do Grupo Especial. Sua diretoria bem que tentou aplicar a terceira virada de mesa seguida no carnaval carioca, mas não conseguiu, então tratou de se reforçar. Ela decidiu contratar o carnavalesco mais badalado do momento, Leandro Vieira, quem já havia dando expediente na agremiação como figurinista nos belos desfiles de 2013 e 2014. Com o atraso da escola em se preparar para o carnaval depois dos imbróglios jurídicos-liesáticos, a solução foi apostar em uma reedição. Com isso, a canção escolhida foi a apresentada em 1981, em homenagem ao compositor Lamartine Babo. Batizado originalmente de “O teu cabelo não nega”, o enredo foi alterada para “Só dá Lalá”.

Abre-alas que iniciou o primoroso conjunto alegórico da escola. Foto: Wigder Frota
Reinterpretando o desfile antes assinado por Arlindo Rodrigues, Leandro Vieira deu mais uma aula estética, apostando na singeleza e no colorido das alegorias e fantasias. A Imperatriz desfilou de forma leve e vibrante na pista, passeando por antigas carnavais, pelas festas juninas e pelos times de futebol para os quais Lamartine compôs seus hinos. A comissão de frente também contou com um reforço poderoso: a dupla Beth e Hélio Bejani fez um excelente trabalho visual. No microfone, a nostalgia falou alto no retorno de Preto Joia para dividir a condução da clássica obra de Zé Katimba com Arthur Franco, embalados pela ótima bateria de mestre Lolo. Esta contou com ninguém menos que a badalada cantora Iza reinando à frente dos ritmistas. Diante de uma apresentação impecável e arrebatadora, a Rainha de Ramos se reencontrou na pista, faturando inquestionavelmente o título com a pontuação máxima.


Menções honrosas: 

Haja desfile bom! Para conseguirmos chegar a esses dez, muitos ficaram de fora! Mas não tema: separamos algumas outras grandes apresentações que deixaram seu lugar no coração do sambista e ganham nossa menção honrosa. 

Paraíso do Tuiuti 2015 (Curumim chama cunhantã que eu vou contar…)

Caprichosos de Pilares 2015 (Na minha mão é mais barato)

Porto da Pedra 2016 (Palhaço Carequinha, paixão e orgulho de São Gonçalo. Tá certo ou não tá?)

Rocinha 2017 (No saçarico do Marquês, tem mais um freguês)

Unidos de Padre Miguel 2018 (Eldorado submerso: Delírio Tupi-Parintintin)

Cubango 2019 (Igbá Cubango, a alma das coisas e a arte dos milagres)

Estácio de Sá 2019 (A fé que emerge das águas)

Inocentes de Belford Roxo 2020 (Marta do Brasil – Chorar no começo para sorrir no final)

O Carnavalize, a partir de seus critérios, fez essa seleção, estimulando a pensarmos o que foram esses últimos 10 anos. Fique à vontade para fazer seu ranking e enviar para nós nas nossas redes sociais! Qual o seu #TOP10 dos seus desfiles marcantes do Acesso?! Queremos saber!

Além dos textos com as listas, o #PodcastDoCarnavalize também retorna trazendo os bastidores de cada escolha, das decisões, do que discordamos e concordamos, um dia após a liberação de cada #TOP10! Os membros do Carnavalize, de quarentena, reviram vários desfiles e votaram pelos 10 destaques de sambas, desfiles, comissões de frente, personalidade… É óbvio que não faltou debate! É conteúdo pra ler e ouvir durante as próximas três semanas! Se liiiga e carnavalize conosco!

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