Filha de pais acadêmicos, Rosa Magalhães nasceu em meio à intelectualidade carioca do século XX. De um lado, estava Raimundo Magalhães Jr, escritor e membro da Academia Brasileira de Letras; do outro, Lúcina Benedetti, teatróloga e pioneira do teatro infantil no Brasil. Aluna da Escola de Belas Artes, foi um outro acadêmico que selou o destino de Rosa com aquela que seria sua maior forma de expressão artística. O pai de todos, Fernando Pamplona, levou a jovem para os bastidores da folia, como fez com grandes nomes do carnaval. Dona de uma genealogia cintilitante, em todos os aspectos, Rosa chegaria ao mundo das escolas de sambas sem nem desenhar uma porta-bandeira, como gosta de contar em seu peculiar tom anedótico. Mas o destino parecia reservar seu rumo junto a algo maior, tanto que seu pai foi jurado do primeiro concurso entre as escolas de samba, nos idos de 1932.
Arte de Jorge Silveira. |
Entre desenhos e riscos, pulando de escola em escola, foi encontrar o Império Serrano em 1982, sob as bênçãos de Pamplona, com um enredo de autoria do mestre acerca da história da própria festa, e ao lado de Lícia Lacerda. A parceira de Belas Artes seria uma partner perfeita durante a década mais diversa e politizada da folia brasileira. Despontaram juntas mostrando o TiTiTi do Sapoti, misturando história e cotidiano. Com o fim da parceria, a eterna professora surfou na onda política ao seu modo em “O boi dá bode” e “Um, dois, feijão com arroz”, já mostrando como sabia mesclar o acadêmico e o popular.
A década de 1990 começou mostrando que era amiga do Rei e se massou para passar na Rua do Ouvidor. Aliando referências das mais diferentes origens, misturou a idade média e o sertão, a história e a fábula; Rosa achou um par perfeito no salão quando desembarcou em Ramos. Na Imperatriz, encontrou a pompa e elegância que só uma monarca podia ter. Mas se engana quem pensa que de luxo viveu esse casamento, pois eles passearam em jegues e beberam uma boa pinga, mostraram a sua cara em bom holandês. Apresentou índios que invadiam os salões franceses e comiam gente, quem diria! Re-contou a história brasileira, aliando o olhar estrangeiro e nativo, em uma grande festa miscigenada. Passeou por bibliotecas, atravessou os mares das paixões em tons vermelhos. Mais de cinco vezes o “É campeão!” na Leopoldina ecoou e fez de Rosa a maior vencedora da Era Sambodrómo. Entre 1990 e 2000, definiu os duelos que marcaram e formaram uma geração inteira de apaixonados pela Certinha de Ramos.
Ilustração de Antônio Vieira. |
Na virada da segunda década do novo milênio, mostrou que estava longe de ficar ultrapassada, foi lá e conquistou mais título fazendo uma festa no Arraiá, cravando-se como a única artista campeã em quatro décadas seguidas. O canto livre de Angola arrepiou e, versátil, mostrou que além de passear em países europeus, sabia reinventar a estética africana na folia. Em 2015, homenageou seu mestre do carnaval, numa reinvenção de si própria, voltando a surpreender.
Seja nos enredos inventivos, nas alegorias bem acabadas, nos figurinos a rigor, entre índios, onças, barcos, anjinhos barrocos, tatus, reis momo e nobres, Rosa Magalhães materializa na Avenida a reunião de todas as artes que é o carnaval, traz consigo sua bagagem secular e influencia gerações de nomes da festa. Para além da pista, essa artista também fez história, foi figurinista e cenógrafa, levou exposições de seu trabalho por lugares no Brasil e na Europa.
Desenho de Bill Oliveira. |
É o nome do carnaval que mais circulou nos espaços de artes, chegando até a Bienal de Veneza e Quadrienal de Praga. Um sucesso que a consolidou como grande diretora de grandiosos festejos de eventos esportivos. Em 2007, reinventou a perspectiva de Brasil na abertura dos Jogos Pan Americanos do Rio de Janeiro, trabalho que lhe premiou com um Emmy Internacional, raridade em terras tupiniquins. Quase uma década depois, voltou ao palco do Maracanã e deu um show de brasilidade ao encerrar as Olímpiadas do Rio de Janeiro em 2016, exaltando o samba e o carnaval para o mundo.
Carnavalesca. Artista multi-facetada. Deusa. Uma das maiores figuras vivas da história das escolas de samba merece todas apreciações possíveis. Ela ganhará uma homenagem que busca celebrar sua trajetória e seu legado. A exposição “Uma delirante celebração carnavalesca: o legado de Rosa Magalhães” reúne um time diverso de mais de trinta artistas, entre carnavalescos consagrados e iniciantes, fotógrafos e artistas das artes plásticas, que dialogam com o estilo e a narrativa da professora. E, para realizar essa grande homenagem, precisamos da sua ajuda! Colabore em nosso projeto de financiamento coletivo e ainda ganhe brindes exclusivos! Saiba mais aqui.
Uma resposta
Uma iniciativa maravilhosa esta expo. Agradeço por ter sido convidado a participar pois, foi um dos maiores reconhecimentos que tive pelo meu trabalho. Um sonho que se conecta a outro sonho.