Assim como o Carnavalize, esse novo espaço aqui no site surge para dar voz a apaixonados, que escrevam, pesquisam e estudam o carnaval. Quando tivemos a ideia do site, em primeiro lugar, queríamos expor nossas opiniões e visões de como os jovens enxergavam e gostariam de contar e encontrar materiais sobre o carnaval. Sendo assim, iniciaremos essa série de textos do nosso público, entenda-se como um “espaço aberto” e sinta-se à vontade para nos mandar seu texto, crônica, artigo, o que for. Com essa iniciativa, buscaremos dar voz a pessoas, que sempre quiseram divulgar escritos sobre a festa, mas nunca tiveram um lugar – assim como nós antes do site.
Por Thaís Velloso
“O corte de verbas para o desfile das escolas de samba, que provocou um debate majoritariamente interno sobre o assunto, deixou claro que as medidas tomadas pelo prefeito — e aqui podemos citar algumas: a ação da Guarda Municipal na Pedra do Sal, impedindo que houvesse a tradicional roda de samba no local; o corte do apoio financeiro à procissão de Iemanjá, que acontece há treze anos em Copacabana; a ausência de investimento na Casa do Jongo, que fechou as portas recentemente por falta de recursos — constituem um projeto de anulamento cultural caracterizado pela intolerância religiosa e pelo preconceito com a cultura negra.
Não me sai da memória o dia em que Tia Nilda, baiana da Mocidade, falou emocionada sobre sua relação com a escola no RJTV, em matéria que foi ao ar em fevereiro do ano passado. Afeto ignorado pelos que desconhecem ou discriminam, o sentimento de torcedores e componentes pela escola de samba, e tudo o que dele emana, é fator que potencializa a confiança e a coragem de enfrentar a dureza da vida e de se reinventar no mundo a partir de um toque de agogô. É encantada por esse afeto que a Mangueira insiste, no esplêndido da poesia, em resgatar nosso respeito, derrubando o cordão de um blocódromo que afinidade nenhuma tem com a festa.
O argumento que insustentavelmente sustenta o discurso sobre o dinheiro negado às agremiações, e cabe lembrar que as do Acesso ainda não receberam nenhum investimento do que foi acordado pela prefeitura, cai ainda mais em contradição devido ao evento organizado em Copacabana no sábado passado, para o qual houve o apoio financeiro que viabilizaria os ensaios técnicos. Evidentemente, a preocupação do prefeito é manter a ordem por meio dos seus próprios imperativos, baseados na não aceitação de outras crenças e manifestações culturais alheias à sua visão de mundo mas vivenciadas por enorme parte da população carioca.
Foi também a pretexto de manter a ordem que, no fim do século XIX e início do XX, membros da elite social criticaram e desqualificaram a Festa da Penha e criminalizaram o samba, por exemplo, tornando manifestações culturais de origem negra, como o batuque e a capoeira, elementos de repressão. O viés preconceituoso que causava essa repressão naquela época é o mesmo que molda, atualmente, um governo que propositalmente afeta a festa popular e caminha na contramão de uma sociedade plural que desenrola a vida no giro da roda da saia da baiana e que se reconhece na lágrima de um integrante da Velha Guarda.
Diante desse cenário, a esperança é verde e rosa: erguendo a bandeira do samba, a Mangueira mostra que pecado é não brincar o carnaval. E assim teremos uma Sapucaí que louva o botequim, o samba, o jongo, a diversidade sexual e de gênero, o bloco sem cordão, os santos e as santas — em especial Nossa Senhora Aparecida, cuja imagem já foi chutada por um pastor da Universal em um programa de televisão. Uma louvação, portanto, à pluralidade e à subversão, com o objetivo de “desobedecer pra pacificar”, de mãos dadas com a letra da Mocidade. Neste Carnaval todos nós somos Mangueira, meu senhor.”
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