por Leonardo Antan e Beatriz Freire
De lá pra cá, Rosa vem fixando como a grande artista da festa através de um estilo clássico mas ao mesmo tempo contemporâneo em sua linguagem. Ao mesmo tempo que seu rótulo de barroca e rococó são usados em tom genérico, a obra da professora se aproxima de fatos dos processos conceituais e estéticos desse movimento artístico, que já se tornou uma forma de pensar o mundo na atualidade. A opulência, as formas curvas, o exagero e o excesso de informação; tudo isso com uma visão particular do Brasil, com afinidades com o movimento romântico, fazem da Rosa uma artista complexa e querida.
1 – “Ligo pra livraria e mando trazerem todos os livros sobre aquele assunto”
2 – Múltiplas referências artísticas
Toda essa pesquisa resulta numa riqueza de informações que é muito bem administrada pela professora em seus carnavais. Formada pela Escola de Belas Artes e criada numa família de intelectuais, ela faz questão de carregar consigo toda sua bagagem artística adquirida através de todos esses anos. Nas fotos, vemos à direita um figurino do pintor Pablo Picasso para uma ópera e, na esquerda, a fantasia de Rosa para desfile da União da Ilha, em 2010. Em seus desfiles, é perceptível a presença de inúmeras referências artísticas de diversos universos diferentes, tanto na arte chamada “erudita”, inspiradas nos azulejos de Adriana Varejão ou nas pinturas de Picasso, quanto aos elementos da cultura dita “popular”, o folclore, o próprio samba e ainda signos da cultura de massa e de entretenimento. Nesse caldeirão, Tarsila do Amaral, Goya e Gaudí convivem com palhaços, super-homens, Chacrinhas e Quixotes. Assim, Rosa faz de seus desfiles verdadeiras galerias de arte com inúmeras referências dos mais distintos meios, mas sempre sem perder sua identidade e a originalidade de sua assinatura.
3 – Uma delirante confusão fabulística
Detalhe da alegoria de 2005 |
4 – Jegues escondidos na História
A deusa barroca também surpreende com enredos que trazem ao público, por diversas vezes, histórias reais e pouco conhecidas, mesmo que os personagens sejam figuras importantes, desde um rei francês a um carnavalesco tido como revolucionário. A já dita curiosidade de Rosa é fundamental na busca por narrativas ainda não contadas, com abordagens diferenciadas acerca de determinados assuntos; mais do que colírio para os olhos e exemplo do apuro estético e sabedoria, é uma verdadeira aula, e a professora faz jus ao apelido, exercendo com maestria o papel educativo que as escolas de samba desempenham com seus desfiles. Rosa articula elementos da História oficial, histórias pessoais e micro-histórias além de causos e pequenos relatos, juntando todos sem hierarquias.
5 – Um pouco de Brasil nessa mistura
Alegoria de 1994 (Fonte: Tantas Carnavais) |
Em todo esse processo de criação dos enredos, um aspecto que se fortalece nos carnavais de Rosa é mesclar referências e histórias estrangeiras com elementos tipicamente brasileiros. Com uma extensa bagagem cultural, não é difícil para a carnavalesca achar um ponto de interseção entre histórias separadas por milhares de quilômetros, fazendo da Sapucaí um ponto de suspensão do tempo e do espaço, promovendo um encontro entre elas. A visualização dessa mistura fica muito clara em desfiles em que pega, por exemplo, contos do dinamarquês Hans Christian Andersen, em 2005 na Imperatriz, e mistura com personagens de Monteiro Lobato; ou mesmo quando une Miguel de Cervantes a Ziraldo, como em 2010, na União da Ilha. Ou ainda, ao unir Os Três Mosqueteiros de Alexandre Dumas com a história real de Giuseppe Garibaldi, em 2006. Fato é que a querida professora não poupa esforços para dar sempre um tempero brasileiro bem especial e exaltar as diversas riquezas de nossa terra em seus trabalhos.
6 – No encontro, a origem da nação
7 – A corte e os índios
Croqui de Rosa Magalhães – Ala das baianas, Imperatriz Leopoldinense 2002 (Fonte: livro Inverso das Origens) |
8 – Caixotinhos e Anjinhos Barrocos
Imperatriz Leopoldinense – 2008 |
9 – Leques, sombrinhas e savanas
Comissão de Frente da Imperatriz Leopoldinense – 1994 (Fonte: Página Tantos Carnavais) |
Apesar de ser uma parte independente do total controle e criação de Rosa, os enredos da professora dão base aos coreógrafos para excelentes comissões de frente. Sua troca com os profissionais resultam em trabalhos memoráveis. Fábio de Mello, sem dúvidas, foi um dos grandes nomes que fizeram uma comissão de frente a altura do excelente trabalho de Rosa; são inesquecíveis os leques do desfile de 1994, os guarda-sóis de 1995, o piano de 1997 num enredo sobre Chiquinha Gonzaga, a caravela humana de 2000 e o bicho papão de 2002. Recentemente, as comissões da Vila Isabel em anos que Rosa assinou os desfiles da escola também chamaram atenção do público: em 2012, Marcelo Misailidis fez uma verdadeira savana africana, com a presença de feras e animais que lá vivem, e a formação de um rinoceronte gigante. Em 2013, o elemento alegórico era um caixote, e sobre ele os bailarinos da comissão de frente traziam uma verdadeira quadrilha de festa junina e o surgimento da vida a partir da terra, também planejada por Misailidis.
10 – Visão do paraíso
Não por acaso, Rosa merece e honra todos os apelidos que recebe. Seja professora, mestra ou nossa deusa barroca, a carnavalesca foi grande nome dos carnavais dos anos 90 e ainda é responsável pelo brilho de tantos olhares quando seus desfiles tomam conta da Sapucaí. Rosa mostra que tem talento e conhecimento de sobra, além de contrariar a necessidade da grandiosidade que as alegorias da última década e meia atingiram, sendo a representação clara de que o maior nem sempre é o melhor. Seus trabalhos carregam sempre a essência de seu nome, uma verdadeira flor, com delicadeza e imponência de uma verdadeira artista, consagrada por seu suor e dedicação.
A exposição “Uma delirante celebração carnavalesca: o legado de Rosa Magalhães” reúne um time diverso de mais de trinta artistas, entre carnavalescos consagrados e iniciantes, fotógrafos e artistas das artes plásticas, que dialogam com o estilo e a narrativa da professora. E, para realizar essa grande homenagem, precisamos da sua ajuda! Colabore em nosso projeto de financiamento coletivo e ainda ganhe brindes exclusivos! Saiba mais aqui.
Uma resposta
Que síntese! Valeu.