por Bernardo Pilotto
Em Duque de Caxias, uma das maiores cidades da Baixada Fluminense, há uma tradição carnavalesca que remonta para o período de fundação do município, nos anos 1940. Nessa época, a escola Cartolinhas de Caxias despontou, chegando a desfilar por três vezes entre as grandes do Rio de Janeiro. Além da Cartolinhas (que deixou o samba “Benfeitores do Universo”, de 1953, como sua marca), havia a União do Centenário, a Capricho do Centenário e a Unidos da Vila São Luís.
Nos anos 1970, aconteceu uma primeira tentativa de unificação, com a fundação da Grande Rio (sem o “Acadêmicos”). Posteriormente, em 22 de setembro 1988, a Grande Rio se junta com a Acadêmicos Duque de Caxias e surge então a Acadêmicos do Grande Rio, uma das maiores escolas de samba da atualidade.
Ao longo desses anos, a Grande Rio disputou título, fez enredos históricos, outros nem tanto, ganhou famas boas e ruins e quase sempre esteve desfilando entre as grandes do carnaval, estando 14 vezes entre as 6 primeiras colocadas.
No início da sua trajetória, a escola caxiense apostou em temáticas identificadas com a negritude. Com bons desfiles, rapidamente chegou ao Grupo Especial, já em 1991. A escola ficou em último lugar, mas se reabilitou com um grandioso desfile e samba (“Águas claras para um rei negro”) em 1992, quando foi campeã do Grupo de Acesso, chegando novamente à elite do carnaval em 1993, de onde nunca mais saiu.
Depois dessa primeira fase muito identificada com a negritude, a escola foi migrando para enredos de caráter histórico. Em 1996, com “Na era dos Felipes o Brasil era espanhol”, o samba trouxe o famoso refrão que afirmava “dar um banho de cultura”. E assim seguiu a Grande Rio até o final dos anos 1990, tendo sua melhor colocação em 1999 (6º lugar).
Foto do desfile de 1996 que trouxe o famoso refrão que marcou a escola. Foto: Wigder Frota. |
Com a virada para o novo século, a escola embarcou na onda de enredos patrocinados e muitas vezes de valor cultural questionável. Também foi a partir dessa época que a escola passou a receber a presença de muitos artistas de televisão. Se olharmos os desfiles, veremos que a Grande Rio acabou ganhando a fama por um fenômeno que se alastrava por quase todas as agremiações.
Mesmo enfraquecida em quesitos como enredo e harmonia, a agremiação chegou a boas colocações, tendo sido vice-campeã em 2006, 2007 e 2010. Tudo parecia caminhar bem e o título era uma questão de tempo.
Só que as mudanças que o desfile das escolas de samba passou a viver, a partir especialmente de 2016, fez com que a forma de construir carnaval da Grande Rio ficasse defasada. O alerta definitivo para isso se deu em 2018, quando a escola só não caiu porque uma virada de mesa acabou fazendo com que nenhuma agremiação fosse rebaixada naquele ano, após um problema no carro alegórico.
Foi assim que a Grande Rio resolveu se reconectar com os valores que marcaram o começo de sua trajetória. O primeiro passo disso foi a valorização de nomes da própria escola para o comando de quesitos importantes, como a bateria, com Fafá. Para 2020, contratou os carnavalescos Leonardo Bora e Gabriel Haddad, ganhadores do Estandarte de Ouro de melhor escola do Grupo de Acesso em 2018 e 2019 pela Acadêmicos do Cubango. Com enredo “Tata Londirá: O Canto do Caboclo no Quilombo de Caxias”, acabou ganhando o vice-campeonato, além de vários prêmios. Aparentemente, o desfile caracterizou uma virada para a história dessa agremiação.
Todo esse processo de mudança e de reconexão com muitas das características que marcaram a escola nos anos 1990 acabou por trazer um novo olhar para a Grande Rio, além de voltar a empolgar muito dos seus componentes. Para o próximo carnaval, ela manteve a dupla de carnavalescos e segue apostando na receita que deu certo em 2020 ao escolher o enredo “Fala, Majeté! Sete chaves de Exu”.
O universo do carnaval só tem a agradecer a essa escolha que a Grande Rio fez.