A doce canção – o verso que balança a rede de luz do infinito universo nos acordes primordiais do tempo, como brisa ou vento, o sopro da criação que vem animar de vida o berço dos seus Orixás. Faz-se a negra corte dos reinos de África. Atravessar o oceano à terra que, assim como aconchegantes braços, se abriu e se redesenhou em seus traços – Bahia de todos os santos e de todos os seus súditos – Yorubás, Jejes e Bantos a tatuar na memória, a soberana história que venceu o Banzo, a corrente e a dor ao manter o espírito alado e livre, pela fé, na força da sua cor. Força que iluminou os terreiros e senzalas, raízes aqui fincadas como um Baobá a resistir e se impor, abrindo alas, de crença e esperança, como poder criador a reconstruir nações, pequenas Áfricas evocadas por seus tambores ancestrais, sua mais rica herança, os cantos e as danças, as tradições e os rituais. Venha transformar a passarela na sua grande casa, o “YLÊ IA OMIN AXÉ IANASSÊ”; em louvação e respeito dobra o rum para o preceito do jeito que deve ser. Abra a roda e faça um terreiro em pleno palco do Anhembi, onde a nossa fé se manifesta e onde a Vai-Vai faz a festa – é o Xirê das divindades no esplendor de sua beleza, com a força da Mãe Natureza, o Gantois hoje é aqui!
Rasga o véu de Orum! Seus deuses mágicos baixando ao Aiyê em cortejo onírico para saudar aquela, que fez da vida a missão da bondade, conhecimento e verdade, traduzidos em doçura e amor gentil que por seus filhos foram derramados, qual pureza de menina, mãe da Bahia, Yalorixá do Brasil.
Ligeiro, Legbá, Mosubá! Mensageiro, venha abrir os caminhos para a grande convocação e faça soar os seus atabaques, que, nessa passarela terreiro se refaz nas mãos de Oduduá, o momento da criação, e assim nos traz a ancestralidade, a elemental divindade do velho senhor da terra. Ecoam brados da floresta como flecha certeira do ofá, cetro do Rei de Ketu, que irrompe da selva junto ao brado do Príncipe Guerreiro, Loci, Loci, e Ewê Vassa, arrastando seu manto de relva, no espetáculo que aqui se encerra.
Vem acender a chama que chama o fogo e resplandece, “káwòò, kábiyèsilé”! É a corte de Oyoó que empresta brilho e luz a essa festa, Rei que acende e assanha o amor ardente da poderosa rainha Obá Siré que aqui, também se faz presente. Senhor que abre espaço, riscando o céu de lampejos e fachos para a deusa Oiyá, rainha dos raios, senhora dos seus desejos e que também conclama a divindade das armas, guerreira de nossas cabeças, que forja o ferro das entranhas.
Que adentre ao salão enfeitado, enfeitiçado de encanto, Eeró! O canto é o som do vento – Iroco que balança ao tempo, onde adormecem seus Ibejis, no sopro de brisa que vem atiçar suas folhas e a legião de espíritos regida por Ewá, no éter que se faz palco da dança das nuvens nos braços Oxumaré, eis cintilante melodia de pingos que vêm molhar a terra e colorir todo o ar.
E, por fim, venha coroar este evento, derramando axé das entidades da água, abençoe e lave a nossa alma, venha curar toda mágoa, Epa Babá! Pai divino do princípio da vida em sua plenitude vem trazer a placidez e a quietude da matriarca do lodo que modela a nossa existência e com carinho e complacência aplacar nossa saudade.
Èru, Iyá! Que nos permita a senhora das ondas receber esse mar repleto de boas lembranças de todos os súditos dessa deusa terrena que nos uniu em seus laços de ternura plena a multidão de fieis que ainda seguem seus passos ampliando as fronteiras do seu sagrado Gantois, e que até hoje reforçam sob a guia de Mãe Carmem, a certeza que o Axé e a força ainda moram por lá.
Orá Iyê Iyê, Ô! Deusa das águas doces, tão doce quanto a nossa mãe, que agora se embala em seus braços, receba de nós essa homenagem, um samba em forma de oração que a Vai-Vai canta e se encanta, pois fala do coração é a mais pura verdade, que hoje todos em nossa cidade se tornam filhos de Oxum, e que jorram lágrimas de felicidade que vêm regar nossas vidas e alegrar o nosso cantar,
Oh! Minha Mãe!
Minha Mãe, Menininha!
Oh! Minha Mãe!
Menininha do Gantois!