Por: Jéssica Barbosa
(Arte: Rodrigo Cardoso) |
No carnaval de 2018, pela primeira vez, quatro escolas de samba oriundas de torcidas organizadas irão desfilar no Anhembi: Independente Tricolor e Mancha Verde na sexta-feira, Gaviões da Fiel e Dragões da Real no sábado, estarão no mesmo grupo mostrando sua força e que merecem ser tratadas com respeito tal qual suas co-irmãs.
Preparamos um dossiê especial para contar um pouco da trajetória de grandes escolas muitas vezes recriminadas, mas que enchem o mundo do samba de orgulho. Na segunda parte, você acompanha a trajetória estrelada de duas escolas que mexem com o coração do tricolor dos gramados: Dragões da Real e Independente Tricolor.
O VOO METEÓRICO DE UM DRAGÃO
A Dragões da Real foi fundada nos anos 2000 por alguns associados da torcida do São Paulo, foi campeã do grupo 4 da UESP já no seu primeiro ano de desfile com o enredo “Circo Criança, Uma Grande Esperança” dos carnavalescos Marcelo Luis e Paulo Fornias, assim subindo para o grupo 3, passou pelo grupo 2 em 2004 o grupo 1 em 2005 quando foi vice campeã e conseguiu subir para o Grupo de Acesso. Foram 3 anos seguidos ficando em quinto lugar, dois terceiros lugares em 2009 e 2010.
Em 2011 a escola conseguiu seu tão sonhado acesso para o Grupo Especial, se sagrando campeã com o enredo “A Felicidade se Conta em Contos” do carnavalesco Eduardo Caetano. Um desfile leve com fadas e magos na comissão de frente e no abre alas marcou ascensão da escola à elite. A ala das baianas representava bruxas em tons de roxo e rosa já a alegoria mais bonita e colorida era a terceira, que representava a casa de João e Maria feita por doces. O samba era bastante correto, cumprindo seu papel de contar o enredo.
NA BAGAGEM TRAGO O SONHO DE VENCER:
Após alcançar o objetivo de chegar na elite do carnaval paulistano, a Dragões veio falando sobre as mães, trabalho assinado novamente por Eduardo Caetano, entítulado “ Mãe, Ventre da Vida e Essência do Amor”. Para representar a natureza na primeira parte do desfile, a comissão de frente veio com uma proposta muito interessante, uma mulher como a mãe natureza grávida e um elemento alegórico fazendo parte do espetáculo como a árvore da vida.
O abre-alas muito grande em tons de marrom caracterizava a natureza e era lindíssimo! O casal de Mestre Sala e Porta Bandeira, Rubens e Lyssandra, simbolizava as garças da fertilidade com lindas fantasias em vermelho. As baianas eram as mães do samba e em suas fantasias retratos delas mesmas, fantasias luxuosas em vermelho e dourado.
O terceiro carro chamava atenção por seu ótimo acabamento e sua simbologia: as mães de fé que perderam seus filhos e buscaram na religiosidade a força; atrás Nossa Senhora Aparecida como a mãe do Brasil. Mães de Santo e mães de adoção vinham nas alas seguintes. Para dar uma leveza no desfile uma alegoria que trazia mães em situações embaraçosas, como as mães de juízes de futebol e de lutadores.
A emoção voltava ao desfile com a ala “Mães em Oração”, uma lembrança às mães que já faleceram, e logo atrás, no último carro vinha o Dragão, símbolo da escola apresentando as mães da escola. O desfile foi embalado por um samba que funcionou muito bem na avenida na voz de Daniel Collete e a escola ficou em quarto lugar, melhor colocação de uma escola ascendente até então.
Para 2014, a Dragões contratou a carnavalesca multicampeã Rosa Deus Magalhães para desenvolver o desfile sobre os anos 70 e 80, “ Um Museu de Grandes Novidades”. A proposta do enredo era fazer uma viagem por essas décadas, citando filmes, novelas e brinquedos que fizeram parte da vida das pessoas. A comissão de frente teve quase toda a sua apresentação em cima do elemento alegórico que representava um cinema onde as pessoas assistiam ao videoclipe de Thriller, do cantor Michael Jackson.
O abre alas mostrou invenções da época como computador, patins com, na parte de trás uma pintura dos carnavalescos Rosa Magalhães e Fernando Pamplona. A rainha Simone Sampaio vinha vestida de Penélope Charmosa à frente da Bateria Ritmo Que Incendeia, fantasiada de Dick Vigarista.
O segundo carro foi dedicado a música com DJ, pista de dança, integrantes dançando break e performando rock. A ala “Cubos Mágicos” apresentou fantasias muito originais, onde alguns integrantes vestiam roupas imóveis e outros com fantasias que faziam o movimento do brinquedo. As baianas vieram como a boneca Moranguinho, causando um belíssimo efeito nas cores verde, vermelho, roxo, rosa e laranja.
A penúltima alegoria trazia as Paquitas e a nave da Xuxa, além de um gigante Palhaço Bozo, importantes figuras infantis das décadas. Os filmes fechavam o último setor, com alas representando E.T, Coringa e Star Wars; a última alegoria vinha com gigantes esculturas de personagens de sucesso do terror. Com um desfile muito bem humorado e nostálgico a Dragões conseguiu o quinto lugar, retornando novamente na Sexta das Campeãs.
Para o ano de 2017, a Dragões contratou o intérprete Renê Sobral que estava na Tom Maior, além de mudar também sua linha de enredo. Vindo quase sempre com temas mais lúdicos, a escola resolveu se inspirar na música Asa Branca de Luiz Gonzaga e contar um pouco da história do Nordeste. “Dragões Canta Asa Branca” era o título do enredo, desenvolvido pela comissão de carnaval formada por Dione Leite, Jorge Silveira, Márcio Gonçalves e Rogério Félix.
Com um dos melhores sambas da safra e, pode-se dizer, o melhor da escola, muito bem interpretado pelo ótimo Renê Sobral, a Dragões veio forte buscando o título. O abre alas representava a fé, com um gigante esqueleto de Dragão a frente e uma capela atrás com muitos detalhes. As alas seguintes representavam animais do sertão, como calangos e serpentes da caatinga; esses que vieram simbolizados no segundo casal da escola.
O destaque do segundo carro foi o mandacaru com um tom vibrante de verde, sua flor foi representada por bailarinos, componentes vestidos de calangos subiam e desciam nas laterais do carro. A ala dos retirantes, que também chamou atenção pela coreografia e teatralização muito bem ensaiadas, mostrava o sofrimentos das pessoas por deixarem sua terra. Em seguida, a alegoria “Transportando Sonhos”, apresentava um caminhão ‘Pau de Arara’ na parte da frente estava decorada por retratos familiares. Compondo o carro, vários integrantes faziam coreografias. Gaiolas, redes, placas e malas também faziam parte da decoração.
O próximo setor do desfile mostrava toda a cultura nordestina com a ala “Sanfoneiros”, além do artesanato em palha, cujo costeiro da fantasia foi concebido na própria palha. As alas “Frevo”, “Maracatu” e “Congada” se alternavam em cores fortes e mais claras. Chegando ao fim do desfile com o Nordeste em festa, a última alegoria apresentava uma grande fogueira. O destaque desse carro vai para os componentes formando a fogueira com tecidos leves que, com a ajuda de um ventilador, subiam e desciam, causando um efeito que esquentou (com o perdão do trocadilho) as arquibancadas do Anhembi.
Um desfile impecável em fantasias e alegorias. A bateria, que brincava fazendo bossas e paradinhas remetendo a música nordestina, deu um show, além do samba muito cantado por todos os componentes da escola e um enredo muito rico em cultura, mostrou que a Dragões não era mais uma promessa de escola grande e sim uma concretização. Apesar do grandioso desfile, a Dragões da Real ficaria sem o título na última nota. O vice-campeonato foi muito festejado pela comunidade, que vem forte e no caminho certo para buscar seu grande sonho: o primeiro título do carnaval paulistano!
UM FUTURO INDEPENDENTE
Tendo sua história no carnaval iniciada oficialmente em 2009, a Independente Tricolor é uma escola jovem mas que já acumula bons resultados e no ano de 2017 irá fazer sua estreia na elite do carnaval de São Paulo.
Seu primeiro desfile pela UESP ocorreu em 2010 com o enredo “São Paulo, Hábitos e Tradições”, conseguindo o primeiro lugar e subindo para o Grupo 3, onde ficou até 2012, quando vice-campeã, atingiu o Grupo 2. Em 2013 e 2014, ascendeu meteoricamente chegando ao Grupo de Acesso. Em 2016, por pouco a escola não se sagrou vice-campeã e ascendeu ao Grupo Especial: ficou com a terceira colocação com o enredo “O que Conta no Faz de Conta?”.
EU QUERO VER A ESPERANÇA RENASCER:
2017 chegou e a Independente buscou nas mentiras a inspiração para o enredo. O desfile abordou as mentiras contadas por políticos e sobre os contos infantis com seus personagens mentirosos.
O desfile começa pelo mentiroso mais famoso do cinema: Pinóquio, que vinha na comissão de frente. O abre alas foi uma dura crítica ao sistema político brasileiro, que retratava o planalto como um lugar cheio de mentirosos, com ratos de ternos saindo das laterais e uma grande cabeça de palhaço no topo da alegoria.
A ala seguinte era sobre as pessoas que ficam cuidando da vida alheia espalhando mentiras, as fofoqueiras. O casal de Mestre-Sala e Porta-Bandeira, Cley Ferreira e Lenita Magrini, vinha representando Lobo Mau e Chapeuzinho Vermelho. A fantasia dela chamava a atenção por ser toda em vermelho e com um capuz na cabeça, primorosamente confeccionada.
O segundo carro trazia de volta ao desfile o personagem Pinóquio, que vinha representado em madeira na frente da alegoria e como menino acima, contando um pouco do conto do mentiroso. Histórias contadas para crianças também marcaram o desfile, como as alas “Loira do Banheiro” e “Bicho Papão”. Já no penúltimo carro, a cegonha foi retratada.
O terceiro casal de Mestre-Sala e Porta-Bandeira simbolizava a natureza mentirosa, onde animais enganam predadores e se camuflam para sobreviver, como o camaleão, que estava presente em mais uma ala. Várias plantas carnívoras estavam na última alegoria, fechando o desfile. O samba composto pelos intérpretes Pê Santana e Rafael Pínah era de fácil compreensão e muito bem cantado pelos membros escola, fazendo com que a escola se sagrasse vice-campeã e subisse ao Grupo Especial.
Para seu primeiro desfile na elite, a Independente trará o enredo “Luz, Câmera e Terror…Uma Produção Independente” retratando filmes e lendas de terror.
Apesar de ser uma escola muito jovem e dando seus primeiros passos entre as grandes, a Independente Tricolor mostra através de enredos e sambas que está no caminho certo para trilhar uma linda história no carnaval.