SINOPSE | Grande Rio: “Vai Para o Trono ou Não Vai?”


… Aquela buzina pioneira de Caruaru foi atraindo outras, assim como fazem os passarinhos com suas cantorias…

Foi no caminhão verde de meu pai, qual o dragāo do meu Sāo Jorge Guerreiro, a quem sou devoto e devo todas às minhas conquistas e proteção, que a buzina tocava sem parar…


Aquele era o som! O som que eu nunca mais havia de esquecer…

– Terezinhaaa, u,uuuu!!!!!

– Grande Riooo, u,uuuuuu!!!

– VAI PARA O TRONO OU NĀO VAI?
– Eu não vim para explicar, mas para confundirrrr!!!!!
– QUEM NĀO SE COMUNICA SE TRUMBICA!…

Hoje me consideram um fenômeno, eu disse: um FE-NÔ-ME-NO da comunicação!

Comigo não tem roteiro, não tem texto, nem ponto eletrônico, direção de palco, de áudio ou de imagens. Tudo é na base da surpresa. Eu mesmo produzo, dirijo e apresento. Sacou a minha sacada, rapaziada?

Desconcertei as convenções, avacalhei o posudo e o empostado. Dei valor ao mambembe e ao artista genial de sempre.

– Alô Alaor, ligue o televisorrrr!!! Que vai começar mais um programa, da TV GRANDE RIO!
Gosto de inventar coisas que não passam pela cabeça de ninguém. Coisas como um disco telefônico sobre uma roupa de jóquei. Eu me visto de bailarina, anjo, palhaço, Napoleão ou Zorro.

– Para o Chacrinha não tem figurino, Seu Nicolino! Tudo cabe e tudo pode acontecer. E aconteceu na roda viva do tempo. As novidades vinham chegando, novas vozes mudaram o panorama da música popular brasileira. E eu captava tudo, foi assim com a Jovem Guarda:


– Vocês querem a cueca do Roberto Carlos?????
…Dizem que sou louco por pensar assim

Se eu sou muito louco por eu ser feliz

Mas louco é quem me diz
E não é feliz, não é feliz…”- (Os Mutantes)

– Sou o pioneiro da loucura!

O papa da Tropicália. Com a minha visão e faro, percebi que eu já era um tropicalista antes mesmo de o movimento surgir. Juntando Iracema e Ipanema, guitarra elétrica e Vicente Celestino. Eu já sabia daquilo e assinei embaixo. “Alegria, Alegria!!!” Era um bordão que eu bolei e o Caetano aproveitando o lance, fez a canção.


– Alô, ê! Alô, ê!
…Chacrinha continua balançando a pança

E buzinando a moça e comandando a massa

E continua dando as ordens no terreiro…

Nos meus programas havia espaço, liberdade cênica e incomodava os conformistas e os conservadores. Viva a Tropicália, Superbacana, o Domingo no Parque e os Mutantes. Viva o Rock e A Seresta, o Coração de Luto e os discos voadores! O Brasil arcaico e o moderno! Viva as bananas ao vento e o iê-iê-iê, o colar africano e a roupa de plástico. O estampado indiano e o espelho na testa.

Viva a geleia geral brasileira! E aquele abraço pra quem fica…

Que eu vou em frente como o velho do pastoril pernambucano, fazendo pilhéria, buzinando a moça e comandando a massa na Buzina do Chacrinha. Viva a vaia, seu Maia! E o calouro que pisa atordoado atrás do microfone que mudava de lugar a todo instante, enquanto a chacrete, com seu colante cavadão faz um show sensual ao som do tema da Pantera Cor de Rosa. É demais!…

– Mas como vai, vai bem? Veio a pé ou veio de trem?
E eu repito Dona Maria: nem tudo na vida é poesia. Enquanto o Chacrinha dorme, o Abelardo perde o sono com o fantasma do Ibope! Eu não sabia nada sobre boletins, planilhas, índices de audiência das classes A, B, C, D e Z. Eu era uma zebra, ó inocente, mas como de bobo não tenho nada, meu camarada, finalllmente, finalllmente eu aprendi como funciona o negócio.

E é ai que entra Dona Florinda, a espiã que me amava. Ela espionava tudo para mim, enquanto eu me concentrava nos mais de dez programas que eu produzia por semana para a rádio e TV. Dona Florinda anotava, gravava, lia e me informava sobre tudo o que estava acontecendo pela mídia e de quebra criticava o Chacrinha quando o programa ia mal e elogiava quando tudo corria bem.


– Vocês querem abacaxi? Vocês querem o Orlando Silva? Ou a calcinha da Wanderleia?
Cheguei com a cara e a coragem, um mero desconhecido, quase sem dinheiro, e agora seu Zé? Tinha que me virar no Rio de Janeiro. Mas como dizia Dona Luzia, “tudo melhora um dia…”

E melhorou.

Isso é pouco? Eu não sou cachorro não!
Apenas criei uma grande confusão nas ondas do rádio e nos canais de televisão.

Comunicação pra mim é juntar, ligar e virar tudo de cabeça pra baixo. Mas rrreallmente, rrrealmente tudo começou no rádio. O tímido Abelardo Barbosa, de voz anasalada e péssima dicção, ganhou sua outra metade, o velho palhaço Chacrinha, graças ao Cassino, meu programa radiofônico que se irradiava de uma pequena Chácara, uma Chacrinha em Niterói. E que foi ganhando audiência em outros estados e até fora do Brasil.
-Eu disse do Brasil varonillll, ouviuuu!
No “Cassino da Chacrinha” éramos eu e um contra-regra. Ali eu criava o ambiente de um cassino imaginário, com roletas, fichas, música tocando, panelas, apitos, grã-finos chegando e artistas dando a pinta. Eu descrevia as roupas que estavam usando, tudo muito estapafúrdio e absurdo para a época. Até o cheiro dos perfumes que invadiam o cassino. O ouvinte via, sentia e sonhava nas noites quentes e frias quando o rádio unia as pessoas e quebrava as solidões noturnas.

“Não, não é sopa não, seu Antão!”


– Roda e avisa! Quem vai pro trono? É o abacaxi? É o bonitão? É o fanho? O gago? A perua? A dondoca? A patroa? A empregada? É a voz afinada ou a cana rachada?

Eu quero tudo na mais perfeita confusão, enquanto a plateia aplaude ou vaia o cachorro mais pulguento, a comerciária mais simpática, a criança mais bonita, todos do Brasil em seus poucos minutos de fama. E a Buzina é uma loucura, celebrando a vida, as datas e os eventos. Salve São Cosme e Damião! Salve o coelhinho da Páscoa! Salve o Sete de Setembro! O Dia dos Pais e das Mães! Salve você também, Seu Araquém!


– E Viva o Carnaval! Porque afinal, ninguém é de ferro!!!
Estou a caminho de meu camarim e enquanto vou deixando o Chacrinha para trás…

– Que rei sou eu?

– O rei está nu, completamente nu, no programa que acaba quando termina…

Sou nordestino de Surubim. Trabalhei no armarinho do meu pai e na pensão da minha mãe em Recife. Fiz três anos de medicina e não segui. Viajei de navio para a Europa como baterista de Jazz e a Grande Guerra me trouxe de volta.

Vejo ainda brilhar a luz derradeira de minha querida Recife, onde tudo me inspirou.

E vou seguindo, ouvindo o belo frevo cantado por Alceu Valença…

Roda, roda, roda e avisa

Que a alegria explodiu no ar

O velho guerreiro sorrindo
Subindo, subindo foi pro céu brincar
Roda, roda, roda que a vida
É um sonho que vai terminar
O bom palhaço não chora
E vai embora sem explicar (BIS)…” (Alceu Valença)

– Ô Maré!
Renato e Márcia Lage

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