SINOPSE | Independentes de Olaria 2021: Batuque pra Penha

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Sou prece festiva, sou fé encarnada. Sou graça acolhida, sou voz Imaculada. Ó virgem, mãe de Deus, a ti entrego meu coração, que carrego no peito, na ginga e nas mãos. Faço do meu cantar peregrina e popular oração.
Sou, no alto do penhasco, o pedido ouvido, onde é sentido o calor e força de sua presença. Não há mal que vença, nem “serpente” para aterrorizar. Faz muito tempo, que lá na freguesia do Irajá, nos domínios do capitão Baltazar, estava presente o sagrado manto da mãe, que, ao ouvir do homem, em seu clamor amedrontado, enviou um lagarto abençoado para sua vida zelar. Pela graça alcançada, uma igreja em seu nome se erguia. A capela um dia seria grandioso santuário, mas também cenário da festa de consagração de tambores, pessoas, sabores e rosários.
Sou Te Deum da colônia portuguesa. ”Nós vos louvamos, ó Deus. Nós vos bendizemos, Senhor”. Querubins e serafins subiam a escadaria dançando fados por seu amor, entre pandeiros e fitas desfilava a romaria de viras, onde as promessas se cumpriam. Quem viria a fazer cortejo seriam Marias, como tu, ó mãe. Que levas o divino Deus nos braços, como as negras baianas com seus os cestos em laços, trazendo quitutes e afagos com os sabores da terra africana.
Sou o som dos tambores já brasileiros da “festa de outubro”. Onde os abastados faziam rezas no templo, onde pretos e pobres dançavam ao vento. A união de tudo, da cachaça e da água benta, do girar apressado e da prece lenta, da liturgia sagrada e da profana dança que desorienta o olhar e o passo de quem lhe contempla. A festa, filha da desigualdade é o triunfo da pluralidade do povo e de sua vontade de ser feliz, de compartilhar e exaltar a própria raiz.
Sou o canto da reunião de preto foro, quilombolas e escravos que, anos depois, virou folguedo de trabalhador pobre e favelado, mas que reunia olhares dos abastados. Dos pontos e canções aos santos, cristão, nagô ou yorubá.  Nascia ali, entre barracas de Ciata, Josefa e Dadá, um novo marco da música popular. O comércio fervia, os jornais cobriam, a cidade partia em direção a Leopoldina para, na Penha, festejar. Dali surgia a canção que na folia de Momo iria reinar.
Sou marcha de ranchos e cordões que pela festa frequentavam. A marra de sambistas e malandros que na festa “duelavam”. A farra de populares que, num carnaval fora de época, a festa transformara. A “beca de pano novo” que Cartola usava para pedir proteção à santa padroeira. O desejo realizado pela mulher amada, de Francisco Alves em seu “braço de cera”. O samba de Vadico e Noel com “feitio de oração”, pela morena que entristeceu seu coração; ou o pedido chorado de quem subiu a Penha a pé, para mostrar sua fé e exaltar Gonzaga e seu “baião”.
Sou a poesia de tantos artistas, de Blancs, Beths, Novos Baianos e Caetanos, que ano após anos ainda fazem questão de preservar minha memória. Sei que sou história viva de minha região, sei que estarei presente em cada oração, sei que serei cantada e escrita num guardanapo em um bar ou em um “la la iá” na palma da mão. Pois minha gente da Leopoldina sempre soube fazer festa e reinventa a própria tradição. Quem diria que hoje eu seria enredo em Olaria e inspiração de mais uma canção. Que nossa cultura popular vença, seja lá quando o próximo carnaval aconteça, para que todo o povo venha pois sou e quero fazer “batuque pra Penha!”.

Texto e desenvolvimento: Guilherme Estevão

Carnavalescos: Caio Cidrini e Alex Carvalho

 

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