#Colablize: 24 de novembro – dia de festa, coroação e reflexão!

 

Texto: Nobres Casais 
Muitos se arrepiam ao ouvir uma bateria tocar. Um surdo, bem marcado, pode até fazer o coração pulsar. Alegorias iluminadas e gigantescas são sempre dignas de genuína admiração. Mas, não há emoção maior para um sambista do que o tremular de sua bandeira. A bandeira carrega em suas cores, e símbolos, a história de uma agremiação, uma comunidade e, até mesmo, de uma nação. Carrega suas glórias, suas mágoas e períodos de transição. 
Em cada fio, entrelaçado pelo poder do tempo, estão os títulos, as melodias dos sambas antológicos, sua identidade e sua gente. Está a sua cor, seu patrimônio particular, posto que nenhum azul é tão azul quanto o de nossa escola de coração, nenhum verde é tão formoso quanto ao que é ostentado com tamanha galhardia, nenhum vermelho é tão encarnado quanto aquele forjado pelos nossos baluartes. Seja quanto for o número de escolas de samba existentes, haverá sempre inúmeros “azuis”, “verdes” e “vermelhos”, cada qual com sua particularidade, nunca idêntico ao outro. Particularidades que só os amantes do samba conseguem enxergar. É por essa razão, que a bandeira, também chamada de pavilhão, é o símbolo mais respeitado e reverenciado de uma escola de samba. Não é de se estranhar que os protetores desse símbolo tenham igual importância, e sejam dignos de igual admiração. 
Em 1992, tendo a importância dos casais de mestre-sala e porta-bandeira como inspiração, o Grupo da Calçada, um grupo de sambistas oriundos do Império Serrano e da Portela, que se reunia regularmente no Bar do Salada (à época, localizado na rua Carolina Machado, em frente à estação de trem de Madureira) para jogar bola, confraternizar e falar sobre carnaval, teve a ideia de criar um dia exclusivo para celebrar e homenagear os responsáveis por proteger e conduzir os pavilhões das escolas de samba do Rio de Janeiro. Entre os integrantes do Grupo da Caçada, estavam Benício (histórico mestre-sala portelense, primo e eterno par de Vilma Nascimento), Waldir Galo (responsável pela criação do “Madureira toca, canta e dança”, instituição voltada para o ensino do bailado dos casais de mestre-sala e porta-bandeira) e Careca, idealizador do Império do Futuro, a primeira escola mirim do Brasil. 
Concebida a ideia da criação do dia do casal de mestre-sala e porta-bandeira, o Grupo da Calçada buscou, no legislativo, a ajuda para tornar oficial a homenagem e, felizmente, a encontrou no vereador Augusto Paz. A Lei Municipal n⁰ 1904*, que institui o dia 24 de novembro como sendo o dia do casal de mestre-sala e porta-bandeira, foi sancionada pelo prefeito Marcello Alencar em 28 de setembro daquele mesmo ano de 1992. A primeira celebração dessa desta data ocorreu ainda em 1992, no Largo de Madureira, tendo como homenageados Vilma Nascimento e Benício. A festa foi custeada pelo Grupo da Calçada, com o auxílio de alguns parceiros, como o empresário Maurício Mattos. 
Com o passar dos anos, o Grupo da Calçada se desfez, muitos se afastaram ou faleceram, e a tradição de realizar uma festa neste dia foi levada adiante pela Associação Cultural Madureira, Toca e Dança que, fundada em 1996 por Waldir Galo, celebra esse dia, de forma ininterrupta, desde então. Desde 2017, Selminha Sorriso, primeira porta-bandeira da Beija-flor de Nilópolis, promove o Encontro Nacional de Mestre-sala e Porta-bandeira, como forma de valorizar, ainda mais, o dia 24 de novembro e os protetores dos pavilhões. 
Ao longo do tempo, o dia 24 de novembro sofreu inúmeras ressignificações, funcionando hoje como uma data não somente de celebração, mas de reflexão, preservação e difusão das tradições, também. E, por que não dizer, de luta pelo reconhecimento desse bailado perante a sociedade. 
Um dos ideais presentes na escolha do dia 24 de novembro e que, por vezes, passa despercebido, é que ele não tem relação com nenhum mestre-sala, porta-bandeira ou acontecimento histórico específico. E isso não é por acaso: os criadores eram avessos a distinção por grupo, posição ou local de desfiles, da supremacia de uma história sobre a outra. É uma data para os casais de mestre-sala e porta-bandeira da Sapucaí, da Intendente, dos primeiros, segundos, dos mirins e dos da Velha Guarda. É a data da união, igualdade e do senso de pertencimento à uma classe que, mais do que existir, resiste. 
Com as restrições impostas pela pandemia de COVID-19, as celebrações do 24 de novembro tendem a ocorrer de forma limitada. Que possamos, mesmo que de uma maneira diferente, prestar as devidas homenagens aos defensores do símbolo maior do carnaval, refletir sobre as modificações, as intervenções coreográficas e a respeito do julgamento. Que, mesmo a distância, não falte afeto e reconhecimento aqueles que transformam amor em arte. E que, tão logo passe esse turbilhão, possamos, novamente, reencontrar os casais que tanto amamos.
*A Lei n⁰ 1904, de 1992, foi revogada pela Lei nº 5146 de 2010, que dispõe sobre a consolidação municipal referente a eventos, datas comemorativas e feriados da cidade do Rio de Janeiro e institui o calendário oficial de eventos e datas comemorativas da cidade, nele está relacionado o dia 24 de novembro como dia do mestre-sala e porta-bandeira das escolas de samba.
Nobres Casais, novembro de 2020

Formado por  mestres-salas e porta-bandeiras, o Grupo Nobres Casais busca divulgar e difundir as tradições, traços culturais e linguístico de uma dança que permanece a margem das academias e grandes instituições. O compromisso, e o desejo maior, dos idealizadores do Nobres Casais é que, a chamada “dança nobre do carnaval”, seja reconhecida como tal e tenha seus valores, personagens, mitos e percussores, reconhecido pela sociedade e pelo meio acadêmico.

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