Processos da criação: Priscilla Mota e Rodrigo Negri – Segredos em sintonia

Por Felipe Tinoco
“Quando a gente chega do
carnaval, o porteiro do meu prédio já pergunta: e aí, o que tem no próximo
ano?”, disse Rodrigo, rindo. “Eu ainda nem escovei os dentes, mal cheguei dos
desfiles”, completou Priscilla. Juntos há mais de vinte anos, o casal de coreógrafos
mais aclamado pelo público e pelos julgadores recebeu o Carnavalize para uma
entrevista no barracão da Estação Primeira de Mangueira.
Na sala, além dos dois, estavam
duas demonstrações do sucesso da união. A primeira, o filho Davi, de cinco meses,
que no meio da entrevista foi trocado de roupa pelo pai quase tão rapidamente
quanto as meninas do popular “Segredo” (Unidos da Tijuca, 2010). A segunda são
as falas de uma dessas meninas, carinhosamente chamada de Gabi, hoje
braço-direito dos coreógrafos. A produtora é só elogios: “eles são incríveis,
trabalham muito, têm um olhar muito especial. Respeitam muito todos os
integrantes, sabem a medida certa entre exigir e abraçar. São poucos diretores
que têm uma qualidade tão grande quanto eles dois”.
Essas espontaneidade e
genuinidade que caracterizam o vínculo profissional e pessoal de Priscilla Mota
e Rodrigo Negri dão o tom do nosso bate-papo. Confira a última entrevista da
temporada da nossa série de Processos da Criação!
Carnavalize: Vocês conseguiram 8
anos consecutivos fechar o quesito, algo que é raro em qualquer setor das
escolas de samba. Ao que vocês atribuem esse sucesso com o júri?
Priscilla: Bom, aqui no barracão
já se dá para ter uma noção disso. É mão na massa. Não tem essa de achar que é
só fazer sucesso, deu tudo certo e relaxar com o sucesso. A receita é
esquecê-lo e partir do zero a cada ano. Estar na Mangueira esse ano tem a ver
com isso, com a gente se reinventar e sair da zona de conforto, estar dentro de
um projeto desafiador, dar uma sacudida na nossa própria carreira.
Rodrigo: A mão na massa é mesmo muito importante. A gente
cuida de todo o detalhe da comissão de frente, desde figurino até tripé

– esse ano inclusive há uma cenógrafa acompanhando a gente. Há diversos
detalhes muito pessoais, que nós, ao lado do dia a dia com nossos bailarinos,
sabemos o que é melhor para cada momento.
P: E a comissão de frente é uma
obra aberta. A gente finaliza o projeto, deixa tudo pronto, mas todo dia a
gente ensaia e todo dia a gente quer aprimorar alguma coisa. A coreografia
pronta não nos libera para ir no cinema, a gente fica pensando em casa o que se
pode melhorar. Agora mesmo fizemos alguns ajustes no carro, sentamos com o
Leandro para rever alguma coisa do figurino. Até a sirene tocar e o portão azul
abrir, a gente está arrumando coisa, consertando, aprimorando. Nós somos
artistas, e na hora que cristalizarmos na nossa própria criação, tem alguma
coisa errada.
R: Nós ensaiamos demais com o
grupo também. Até brincam com eles (os bailarinos): “ah, vocês trabalham com a
Priscilla e o Rodrigo? Pelo amor de Deus, eles ensaiam demais!”. E é essa a
receita do sucesso, trabalho, não tem como contar só com a sorte. A gente
trabalha em cima dos imprevistos que podem acontecer na hora, e antecipa o que
pode dar errado, tentando ajustar essas coisas.
Carnavalize: Como vocês começaram
a trabalhar no carnaval? O trabalho que realizam com as escolas de samba é
muito diferente do trabalho que vocês fazem fora da Sapucaí?
P: Então, a gente sempre amou
carnaval.
R: A gente assistia os desfiles
nas arquibancadas, comprava fantasia de ala, desfilava.
P: Alguns amigos coreógrafos
começaram a nos chamar para desfilar em carros com coreografia, pintava convite
para desfilar em queijo… Chegamos a desfilar na Lins Imperial, no Grupo B.
Quando começamos a fazer comissão de frente, paramos de curtir carnaval. Em
2005, um coreógrafo que era do Municipal nos chamou para trabalhar na comissão
de frente da Tradição. Ele assumiu o posto faltando um mês para o carnaval e
precisava de bailarinos profissionais para conseguir realizar o trabalho tão
rapidamente. O Rodrigo acabou indo de assistente e eu de bailarina. No ano
seguinte, o coreógrafo foi chamado para a Tijuca e me convidou para ser assistente dele, enquanto o
Rodrigo foi componente na comissão do Salgueiro, no carnaval do Microcosmos,
pois ele queria ter a experiência de desfilar. Então, depois do carnaval de
2007, o Lobato (coreógrafo) saiu para a Viradouro. A Lucinha Nobre, que era porta-bandeira da
escola e nossa amiga, acabou sugerindo que o Rodrigo viesse para a Tijuca e nós
ficássemos responsáveis pela comissão de 2008, nosso primeiro ano.
R: No teatro tem ensaio geral,
que conta com toda equipe e estrutura. Mas essa disciplina do ensaio do teatro
é muito presente no nosso trabalho com o carnaval. Se estiver chovendo, a gente
dá um jeito, espera a chuva parar. Às vezes não tem ninguém na Cidade do Samba,
só a gente (risos). Aí a gente cobre o carro, mas pode acontecer isso tudo no
dia, lá na avenida, então a gente treina para isso.
P: Sobre a relação entre os
diferentes trabalhos, o carnaval nos ajuda a ser “safo”. Se acontece um
problema, a gente não sofre o problema, a gente resolve. Carnaval é puro
imprevisto, e a gente precisa se programar para que tudo dê certo. Por mais que
nós ensaiemos muito, o Sambódromo tem desnível, é aberto à chuva, tudo pode
acontecer. A gente deixa o carro no sábado de carnaval lindo, maravilhoso, mas
não sabe o que pode acontecer com o carro no trajeto dele daqui (Cidade do
Samba) até a Presidente Vargas. A gente tem que chegar junto com ele e ver se
está tudo certo. Em teatro não se tem esses perrengues. Já do intercâmbio do
ballet para o carnaval, a disciplina e o ensaio é o que trazemos.

“A mão na massa é mesmo muito importante. A gente cuida de todo o detalhe da comissão de frente, desde figurino até tripé”


Carnavalize: O carnaval tem um processo
de escolha de enredo, lançamento de sinopse, definição do samba… Em que momento vocês
concebem a coreografia e como é esse processo? Costuma ser diferente de ano a
ano?
R: Tem diferença de ano a ano,
nunca é igual. Não há uma regra, depende muito do enredo e da ideia que ele
proporciona para gente de ideia.
P: O samba também nos inspira
muito. Há sambas que pensamos “caramba, de onde vamos tirar (a coreografia)?”.
Esse ano está sendo ótimo, a gente queria que o samba fosse maior, para a gente
ficar mais tempo na cabine, porque é muito bonito, o enredo é tão incrível.
Para esse carnaval, nós sentamos com o Leandro, que explicou o enredo todo e já
saímos daqui com várias caraminholas na cabeça. Demora um pouquinho para a
gente entender para aonde vai; sobre o que a comissão falará, qual caminho tomaremos,
se falaremos de algum setor ou faremos uma síntese do enredo… A gente já
pensa no conceito, no que vamos fazer, com essas informações. Com a definição
do samba, a gente cria a coreografia propriamente, o movimento, como a gente
organiza o que a gente pensou. Mas dentro de todo projeto, a coreografia é 10%.
Para a gente
é a parte mais fácil por conta da nossa formação como bailarinos. Tudo que
envolve a coreografia, o entra e sai do carro, a parte técnica, a logística, a
cenografia, o figurino que às vezes é um efeito e você precisa ficar em cima
para dar tudo certo… A produção sempre é mais trabalhosa que a coreografia.
R: A coreografia serve para
costurar o nosso pensamento, a nossa ideia. Há coreógrafos que gostam de
coreografias que visualmente parecem muito difíceis. Os nossos bailarinos se
esforçam muito, é difícil, mas a coreografia tem mais essa função de costurar
nosso conceito. E o grupo é muito rápido, a gente já trabalha junto há mais de
10 anos, e eles dão sugestões, solucionam algumas coisas.
Carnavalize: E como funciona o
processo de concepção em dupla, com duas cabeças pensantes?
Gabi: Existe uma palavra: cumplicidade.
Onde um acaba, o outro começa. Onde um termina, o outro chega. Eles são um elo.
É cabeça e coração e coração e cabeça, é impressionante.
R: Às vezes um preciso estourar e
é preciso respeitar isso. O respeito é muito importante.
P: Tecnicamente, se eu pudesse
separar, ele cria e eu organizo. Tirando toda a parte do processo, da
colaboração de todo mundo que chega e faz comentários para somar. A gente foi
ensaiar no Sambódromo anteontem e eu fiquei olhando para os empurradores que
foram levar o carro, que nunca assistiram o ensaio, para ver a reação deles.
Também achei legal que uma funcionária do Sambódromo me ligou para elogiar o
ensaio. Tudo que vem de fora agrega. Ontem eu mostrei o vídeo (da comissão)
para a minha mãe pela primeira vez e ela perguntou “por que eles estão de
costas?”. A gente viu de novo e resolveu mudar, colocar de frente (esses
componentes). Tudo ajuda.
R: Essa coisa que a Pri falou que
eu gosto de criar é relacionado com movimentação, coreografia, que fica mais
comigo. E ela organiza, porque eu tenho preguiça dessa coisa de organizar, de
“fulano de tal, fila aqui”, “desenho para lá”, ensaiar “braço”. Isso fica mais
com a Pri, uma coisa meio tia (risos).
Carnavalize: Vocês conseguem
ensaiar na Sapucaí com o carro?
P: Muito raramente a gente leva o
carro, mas esse ano a gente está levando bastante. O Leandro é um cara que tem
uma cabeça muito ‘pra frente’ em relação a isso
e a gente já levou o carro para ensaiar quatro vezes. É uma demanda, precisa de
gente para levar, tem a coisa do trânsito…. É um esforço. Aqui na Mangueira a
galera quer muito ganhar, então há esse comprometimento forte.
Carnavalize: Há nitidamente um
clima muito bom entre vocês e todo o elenco e há diversos rostos que se repetem
todo ano nas comissões de vocês. Como funciona esse trabalho em conjunto com
eles?
P: Harmonia é fundamental. A
gente não consegue trabalhar num ambiente ruim. Alguns bailarinos estão conosco
há muito tempo, e quando precisamos de mais gente, pedimos indicações dos
próprios bailarinos. Eu nunca peço bailarino bom, peço bailarino gente boa.
Ensaiando, a gente vai fazer a pessoa executar bem a coreografia.
R: A nossa cartela de bailarino é
muito grande, a gente já trabalhou com diversas pessoas. Só no Segredo (Unidos
da Tijuca, 2010), foram mais de trinta bailarinos. O legal do nosso grupo
também é que muita gente para e continua conosco de outras formas. A própria
Gabi, a Amanda que nos apoiará no desfile e já foi componente durante quatro,
cinco anos… Há vários eventos que o pessoal participa com a gente também,
diversas outras coisas.
P: Na Dance Solutions (empresa
dirigida pelo casal), a gente faz muitos eventos artísticos para o meio corporativo. Essa galera que trabalha
com a gente acaba fazendo isso também, o próprio show da Ivete… O carnaval é
uma vitrine, e vai fidelizando, porque gostam do nosso trabalho e da nossa
experiência com produção.
R: Nós fizemos trabalhos para
Bradesco, Coca-Cola, Renault, apresentações para Michelle Obama, para o Lula,
participamos de diversos programas de TV, na Xuxa, na Ana Maria Braga, no
Fantástico. Vários eventos esportivos também, como Liga Mundial de Judô, Liga
Mundial de Vôlei, Copa, Olimpíadas… Além de uma experiência muito legal em
Angola, no concurso de Miss do país, coreografando o Segredo com pessoas de lá
que não eram bailarinas.
Carnavalize: Vocês são conhecidos
por trazerem elementos visuais de forte impacto para o desfile desde a troca de
roupas, até as cabeças caindo, a mola do Gonzagão. Em 2016, a própria Ivete
fazia esse papel de impacto e por si só já causava explosão. Primeiro vocês
pensam na ideia da comissão e depois nesse elemento, ou ele é pensado desde o
início?
P: Depende. Ultimamente tem sido
depois, mas na época da Tijuca foi predominantemente antes, após a cobrança do
segredo, quando ficamos até estigmatizados por isso. Não é que não queremos ser identificados como
casal segredo, casal que faz mágica, mas há projetos e projetos, enredos e
enredos.
Em 2012 era simples, só as molas, e foi um dos anos que eu mais
me diverti. Deu muito certo pelo conjunto da obra.  A gente não pensa mais no efeito antes da
ideia.
R: É, às vezes cabe. A gente pode
estar vendo um espetáculo e pensar como aquilo se encaixaria num desfile, como
foi com a bola (Grande Rio, 2016), quando assistimos o Força Bruta. Encontramos
por coincidência os responsáveis, que eram argentinos, em um evento da Globo
que a gente estava fazendo e se preparando no camarim ao lado do deles. Quando
fomos nos apresentar, eles já nos conheciam, conheciam nossos trabalhos, e foi
uma parceria bem legal.

“Sobre a Mangueira, a gente percebeu aqui como a equipe está em prol do trabalho. Se a gente precisa arrumar um ferro que soltou, na hora resolverão. Não tem aquilo de “segura um pouquinho que depois eu resolvo” e não resolve.”

Carnavalize: Na avenida, a
Priscilla costuma comandar os bailarinos e o Rodrigo, a ficar no radinho. Quem
é responsável pelo o quê na passada pela Sapucaí?
R: A Pri vem com a função de
puxar o andamento do desfile, comandar e fazendo os sinais referentes às
coreografias, de parada ou a de júri. E eu venho acompanhando o tripé, que
normalmente tem alguma manobra, precisa parar para a entrada dos bailarinos…
Eu venho nesse backstage, que é a parte mais tensa. Eu não posso me desgrudar,
preciso estar muito concentrado, para observar as marcações das caixas da
avenida. Dificilmente eu consigo relaxar. A Pri vem no comando e disfarçando no
sorriso (risos).
P: No ano do Ayrton Senna (Unidos
da Tijuca, 2014), o carro de corrida quebrou. Eu olhava para ele (Rodrigo) e
ele estava tenso, e eu vinha com sorriso coreografado.
R: Normalmente eu venho em
contato com a Gabi, e ela vem dentro do tripé, organizando tudo e resolvendo os
problemas que possam surgir. Nesse carnaval de 2014, todo processo foi
complicado porque o carro de Fórmula 1 deu um monte de problema nos ensaios. No
dia do desfile, depois que a gente resolveu todos os problemas, o pneu furou.
Quando vimos, começamos a correr atrás de um outro pneu. O engenheiro do carro
conhecia uma borracharia, a gente conseguiu trocar lá e pronto, tudo resolvido.
No primeiro julgador, o carro funcionou. Mas o piloto do carro sugeriu
desligá-lo entre cada cabine para não ter problema com o fato dele esquentar
dentro do tripé. Aí eu falei pra Gabi: “Gabi, prepara jurado, liga o carro”,
para a gente se apresentar para outra cabine. Ela foi e me falou “o botão
entrou, o carro não ligou”.
P: A gente tirou a nota máxima, o
júri amou, mas sabe quanto o botão custava? Cinco reais.
R: Eu falei “dá um jeito, abre o
carro”. Tiraram a carenagem com as mãos para tentar fazer uma ligação direta.
No terceiro jurado, perguntei pra Gabi e ela disse que não ligou. Eu sei que
terminou o desfile, quando passou no quarto julgador, a Gabi falou “ligou!”
(risos). Ali já não adiantava mais. A gente saiu arrasado daquele desfile, mas
a comissão segurou na raça, com a execução e a coreografia perfeitas.
P: Quando terminou aquele
desfile, eu falei “eu não quero mais fazer carnaval, chega, para mim deu”.
Carnavalize: Isso influenciou a
saída de vocês da Tijuca?
P: A gente não saiu porque o
carro deu problema, foi uma série de questões. Quando há um desgaste artístico,
não tem como você se segurar. É natural, isso acontece com o tempo. Por isso
acho que para o artista é muito importante você estar sempre renovando o ciclo e
fazendo aquilo que acredita, sem sofrer. Quando está sofrendo, tem que parar.
Para o Rodrigo era mais tranquilo, mas eu sofria.
R: Lá a gente sofria pela pressão
e achamos melhor mudar os ares e fomos para a Grande Rio.

“Para além de saber o que dá certo, a gente sabe muito mais o que dá errado. Por exemplo, não acompanhar um projeto, deixar o barracão tocar e não estar perto… Não dá certo.”


Carnavalize: Há um intercâmbio
entre os coreógrafos de comissão de frente? Como funciona essa relação entre
vocês?
P: A gente troca bola meio no
muro das lamentações. A gente não pede ajuda para não “abrir” (contar os
detalhes da comissão), mas a gente tem vários amigos que fazem comissão, minha
irmã (Claudia Mota) faz, a gente chora pitanga junto… Somos muito amigos do
Jorge (Teixeira) e do Saulo (Finelon) e todo ano quando acaba a gente fala
“chega, último ano”. Dois meses depois já estamos nos perguntando “e aí, já
começou? Como está?” (risos).
Carnavalize: As comissões
geralmente dialogam com o restante na escola e isso envolve uma conversa com os
outros profissionais. Vocês trabalharam com o Luiz Carlos Bruno, com o Paulo
Barros, o Fabinho, o casal Lage e agora com o Leandro. Existe uma diferença
muito grande em trabalhar com profissionais tão distintos? E como fazer para
que exista ao mesmo tempo autonomia no trabalho de vocês e que a comissão não
seja só um apêndice da escola, sem dialogar com seu restante?
P: Eu acho que é importante viver
o dia a dia das escolas. É que nem água, você vai se moldando àquela estrutura.
Ao mesmo tempo a gente tem um estilo de trabalhar – não só de resultado, mas
também de percurso até o dia do desfile – muito particular e que a gente
respeita. Há coisas que a gente se molda à escola e há coisas que a escola se
molda no nosso ritmo. Para
além de saber o que dá certo, a gente sabe muito mais o que dá errado. Por
exemplo, não acompanhar um projeto, deixar o barracão tocar e não estar
perto… Não dá certo.
A gente cobra muito para conseguir passar
curtindo na avenida, em um trabalho que a gente saiba que não tem risco de dar
errado. A gente quer muito aprender com todos eles – e por isso a gente está
aqui para trabalhar com o Leandro -, a gente aprendeu muito com todo eles e,
depois de 12 anos de carreira, a gente aprendeu o que dá errado e a dizer
alguns “não” a determinadas coisas.
R: A gente gosta de acompanhar o
processo, ver os desenhos do carnaval, não só os da comissão de frente. Isso
serve como referência para gente, ajuda a definir a nossa ideia. Aí a gente
pensa se seguiremos algum setor da escola, se faremos uma síntese do enredo. A
gente adora conversar com os carnavalescos até fechar o nosso pensamento.
Além da harmonia, a sintonia do casal é o grande trunfo de seus trabalhos. 

Carnavalize: E como está sendo
trabalhar na Mangueira e o que motivou a vocês a virem para cá?
P: Primeiro que quando a gente se
desligou da Grande Rio eu já estava grávida de um mês e eu pensei em não fazer
carnaval. Mas aí começou, todo mundo ligando, vários presidentes e diretores
ligando. O único carnavalesco, o único artista que ligou para gente, foi o
Leandro. Para nós,
muito mais do que nosso nome, salário e passe, a gente quer ser feliz.
R: É importante esse bate-bola
entre os artistas, enriquece dos dois lados. A gente já ouviu tanto que nós
somos caríssimos, gente perguntando como a Mangueira está conseguindo pagar… É engraçado (risos).
P: Normalmente quando alguém
chama para contratar, liga, no pós-carnaval rola aquela dança de cadeiras,
perguntam quanto a gente ganha, quanto custo um projeto nosso e o que se
precisa fazer para estarmos em uma escola. E isso foi a última coisa que
falamos com o Leandro, que estava interessado em entender como a gente trabalhava.
Primeiro foi um casamento artístico e depois que rolou toda negociação.
R: Sobre a Mangueira, a gente percebeu aqui como a equipe
está em prol do trabalho. Se a gente precisa arrumar um ferro que soltou, na
hora resolverão. Não tem aquilo de “segura um pouquinho que depois eu resolvo”
e não resolve.
Ligam dizendo quando acabam e ainda perguntam se precisa
de mais alguma coisa. A gente sentiu essa diferença aqui na Mangueira, para que
tudo dê certo. Cada uma tem suas particularidades, mas isso foi uma coisa que
sentimos aqui.
P: A gente tem muita gratidão por
onde a gente passou porque as escolas que nós trabalhamos nos fizeram ser quem
somos hoje, de aprendizado, de tudo, de tudo. A gente aprendeu com cada pessoa
que a gente trabalhou, tanto na Tijuca quanto na Grande Rio. É a soma, a gente
vai somando. E chegou um momento que a gente viu o carnaval do Leandro e queria
trabalhar com ele, para trocar, aprender, para viver a experiência e a emoção
da Mangueira. A gente não tinha vivido essa experiência de estar em uma escola
que tivesse uma nação, que fosse uma representatividade cultural no âmbito
nacional. Com todo respeito pelas escolas que a gente passou, é um diferencial
pela comoção nacional que é a torcida da Mangueira e a sua representatividade
na nossa cultura. Então eu acho que a gente está construindo nossa história com
experiências muito boas.

“É muito bom a gente ter que voltar para nossa criatividade, sim, e isso é uma coisa que a Mangueira está ajudando bastante a gente. É um momento complicado do país, não dá para gente enlouquecer e ser artista mimado.”


Carnavalize: Vocês trabalharam
com alguns enredos mais abstratos (como coleções, espaço, segredo, medo no
cinema e baralho) algumas homenagens (como Chacrinha, Senna e Ivete), os
famosos CEPs (como Alemanha e Santos) e agora estão diante de, sem dúvidas, o
tema mais político e denso dos carnavais que já fizeram. Como foi conceber esse
projeto?
P: Foi difícil. Não foi fácil até
achar o que a gente iria fazer. A gente não tem um desfile para contar uma
história, a gente tem alguns minutinhos. É pouco para pensar a mensagem inteira
do desfile da Mangueira, mas acho que a gente foi muito feliz na nossa escolha
porque… Não posso falar! (risos). A gente foi por um caminho muito legal.
Como artista, esse enredo nos tirou da zona de conforto completamente. Os
outros enredos eram mais diretos. Agora, a gente pensou “qual a mensagem que
queremos passar?”, “como essa mensagem chegará?”, dois minutos só… Complicadíssimo.
R: Mesmo assim dará para
identificar nossa marquinha, sabe? A gente tentou se moldar, reinventar, mas
querendo que as pessoas continuem a identificar que ali é o nosso trabalho.
Carnavalize: Como enxergam o
panorama atual do quesito, diante das crises existentes no carnaval? Acham que
a apresentação das comissões de frente condiz com a realidade das escolas?
P: Muito complicado. O quesito
realmente está em um momento de transição e tentando se encontrar. A culpa
também é nossa (dos profissionais de comissão de frente). Houve uma fase em que
o céu era o limite, e agora a gente tem essa realidade financeira do carnaval. É muito bom a gente ter que
voltar para nossa criatividade, sim, e isso é uma coisa que a Mangueira está
ajudando bastante a gente. É um momento complicado do país, não dá para gente
enlouquecer e ser artista mimado.
R: A gente tem que saber até onde
a gente pode ir. Não adianta a gente ficar sonhando e o negócio não vai
acontecer. Vamos até onde a gente consegue, até onde a gente pode ir. Foi esse
o nosso pensamento em relação ao projeto desse ano.
P: A gente já viveu de tudo,
então para gente é tranquilo. Mas a realidade é outra. A gente já tem
experiência de lidar com essas situações, então se nos derem muito dinheiro a
gente fará, se derem pouco dinheiro a gente fará.
Carnavalize: E a realidade do
julgamento, consideram válida e com critérios bem definidos?
P: Cada ano é um projeto
diferente. Ano passado, o Renato Lage vinha com telão de led, vinha com vários
neons, era uma escola tecnológica. Por que não apostar em uma ideia tecnológica
se o desfile pede isso? Foi assim também no ano da bola. Era um projeto
internacional, tem transportadora… Mas era tudo dentro da realidade. Se você
se justifica sua ideia, sendo grande ou pequena, está tudo certo. O que não
pode, na minha opinião, é trazer um elemento gigantesco só por ser grande, com
gratuidade. Por outro lado, o jurado às vezes espera da gente coisas que o
enredo não pede. É complicado estar na nossa pele e dar um buffet que agrade a
todos, e a gente conhece nossos jurados, conhecemos o que eles gostam.
R: A gente carrega isso (a
expectativa) um pouco. Há uma comparação de nós com nós mesmos. Os critérios de
julgamento acabam nebulosos.

Carnavalize: Já desistiram de algum
projeto e alguma ideia por conta de risco?
P: Não desistimos de nenhum
projeto, mas eu teria desistido do carro (Unidos da Tijuca, 2014) pelo risco. E
outro que foi muito arriscado e eu não faria de novo foi o Thor (Unidos da
Tijuca, 2013), com os bailarinos lá em cima.

“Não é que não queremos ser identificados como casal segredo, casal que faz mágica, mas há projetos e projetos, enredos e enredos.”

Carnavalize: A chegada do Davi
deve impactar em diversos aspectos a vida de vocês! Estão sentindo alguma
diferença no próprio processo de criação da comissão de frente com o guri no
mundo?
P: Eu acho que foi muito bacana
porque eu estava grávida no carnaval passado, e a gente tentou engravidar
durante alguns anos em um período que não atrapalhasse. Eu não queria estar com
um mês de gestação na avenida, subindo em tripé, mas está aí, deu tudo certo.
Conseguimos passar por aquele carnaval, estamos conseguindo passar por esse, e
está super tranquilo. Achei que seria um caos, mas eu estou muito mais calma
com ele.

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