#SÉRIEDÉCADA: os 10 desfiles que foram verdadeiros delírios coletivo da década

A #SérieDécada traça um panorama de tudo que aconteceu nestes últimos anos, com texto novo todas as segundas, quartas e sextas-feiras. A segunda década desse século, iniciada em 2011 e finalizada no carnaval que acabou de terminar em 2020, trouxe muitas reviravoltas e transformações para a folia!
Além disso, nos dias seguintes às divulgações dos textos – ou seja, terças, quintas e sábados – um podcast especial será lançado com nossos comentários em áudio sobre os desfiles, os bastidores das escolhas, e as nossas divergências de opiniões!
Como é impossível fazer uma seleção que agrade não só às leitoras e aos leitores, como também aos integrantes do Carnavalize de forma unânime, cada categoria também contará com menções honrosas que por pouquíssimo não entraram na listagem principal.
Arte e visual: Vítor Melo.

Por Leonardo Antan, com a colaboração de Felipe Tinoco
Infelizmente, nem só de bons desfiles vive o carnaval carioca. Aqui no nosso panorama da última década, já lembramos as apresentações mais marcantes da folia e as que acabaram caindo no esquecimento indevidamente. Hoje é o dia de comentar algumas que ainda são muito lembradas, mas não pelos motivos convencionais. Ora por gerarem memes coletivos, ora por nos brindarem com passagens no mínimo controversas. A gente até se pergunta: aquilo aconteceu mesmo ou foi um delírio coletivo?
Quem nunca errou, não é mesmo? Com a melhor das intenções – a de rir – a gente diminui o tom de seriedade para falar de momentos icônicos, recheados de ensinamentos.
Bora olhar essa lista, aprender com os erros e evitá-los? Se o futuro só se muda conhecendo o passado, um pouco de humor também não faz mal a ninguém! 
Ah: ao invés de fotos e registros dos desfiles, dessa vez, os desfiles estarão acompanhados com memes especialmente preparados que darão o tom dessa divertida lista!
Unidos do Porto da Pedra 2012
(O iogurte azedou)

Existiu um tempo em que patrocínios voluptuosos enchiam os cofres das escolas de samba. Parece que estamos falando de milhares de anos atrás? Talvez! Mas ainda no início da década quase todas as escolas corriam atrás de seu troquinho falando de uma alguma cidade aleatória ou de empresas que nada se relacionavam com a folia. O auge de todo esse processo acabou caindo na conta de uma certa vermelho e branco ao propor um dos enredos mais debatidos e polêmicos do carnaval: o iogurte.




Antes de chegar a São Gonçalo, a empresa de laticínios já havia batido na porta de outras agremiações propondo um gordo patrocínio para quem aceitasse o tema. A Porto vinha de uma das suas melhores apresentações nos onze anos que ficou do especial, como lembramos na lista de apresentações esquecidas. Precisando uma injeção, acabou aceitando de bom grado a ideia, que mal havia? Para desenvolver o tema, o carnavalesco Roberto Szaniecki foi contratado. Ele já tinha experiência em enredos alimentícios e havia se saído muito bem em 2005. O polonês acabou dando uma veia histórica ao tema, o que acabou gerando ainda mais debates. A polêmica já tomou conta do mundo do samba antes mesmo da apresentação, tanto que o carnavalesco acabou deixando a escola antes da escolha de samba, alegando divergências criativas. Para o seu lugar, foi contratado Jaime Cezário, quem deu sequência ao trabalho.

Após levantar tanto debate no pré-carnaval, a Porto da Pedra acabou entrando na avenida praticamente rebaixada. Ninguém poupava críticas à agremiação. Além do tema mal desenvolvido, o samba também não era dos melhores, com passagens com gosto para lá de duvidoso. O delírio coletivo da apresentação começou já na comissão de frente que trouxe os lactobacilos da folia. Isso mesmo, os organismos responsáveis por transformar leite em iogurte. Não é um delírio coletivo? Bem verdade é que a promessa de altas quantias até foi realizada, tanto que o que se viu na avenida foi uma escola luxuosa e bem acabada. Isso não foi o suficiente, entretanto, e a Porto acabou rebaixada em um ano que caíam duas e ficou o marco na história carnavalesca: vale realmente tudo pelo patrocínio?  

Acadêmicos do Grande Rio 2013
(Mergulhando no petróleo)

Não bastasse o sofrimento do ano anterior, Roberto Szaniecki acabou se vendo envolto a mais uma polêmica. Após conseguir desenvolver bons temas patrocinados e garantir boas posições para a Grande Rio entre 2005 e 2008, o polonês se reconciliou com a tricolor de Caxias, retornando à escola com mais um tema espinhoso na mão. O ano era 2012 e na pauta política estava em discussão a redistribuição dos royalties da exploração do petróleo pelo Brasil. O Rio de Janeiro, como um dos maiores estados extratores do combustível fóssil do país, viu parte de sua receita ameaçada. Falando em receita, foi atrás de uns trocados que a Grande Rio decidiu apostar no tema e se posicionar na pauta que se propunha a defender “o que é meu” – no caso, o que era do Rio. O resultado? Bem…
A comissão de frente com escafandristas e o verso do samba que dizia “hoje eu vou mergulhar profundo” dão o tom do que foi esse desfile: um abismo sem fim de vergonha alheia. Como gerar alas e alegorias de um enredo tão pouco denso? Ao menos, Szaniecki fugiu da linha histórica de tentar contar a história do combustível fóssil, algo que ele já havia explorado em 2008. Então, as alegorias e fantasias acabaram sendo uma espécie de aula de investimento do dinheiro público: os recursos podem ir para saúde, educação, segurança, cultura… O desfile acabou como um compilado de segmentos potenciais de melhoria com a verba do petróleo, com alegorias e fantasias pouco caprichadas. Outro fato foi a estreia do talentoso Emerson Dias como intérprete oficial da escola, que, ao lado de Nêgo, segurou na animação o esquisito samba. Não bastava tantas qualidades, ou tanta falta delas, mais um episódio icônico ajudou a transformar esse carnaval em alguma espécie de delírio coletivo: o nascimento de um meme atemporal. Depois do clássico “hoje é dia de rock bebê”, Christiane Torloni ainda faria nascer o lendário “tô no carro da iguana”. Muito mais memorável que todo o desfile. Este ainda conquistou um inexplicável 6º lugar e retornou nas campeãs, comprovando que pesadelos se repetem.  
Mocidade Independente de Padre Miguel 2013 
(Rock In Rio? Não vou!)
Da lama então…. A flor se abriu? Para quem achou que bastava apenas um delírio coletivo em 2013, achou errado! Assim como os outros últimos, esse delírio começou na promessa de alguns trocados a mais. Ah, mais uma vez esse tal de patrocínio (furado). Antes mesmo da apresentação de 2012, o enredo sobre o maior festival de música brasileira foi anunciado com pompa e circunstância como tema da Estrela Guia de Padre Miguel, na promessa de uma polpuda contribuição da família Medina. Nos bastidores, a verde e branco ainda passava por uma forte crise política, sob a gestão de Paulo Viana, em uma das fases mais complicadas da história da agremiação. 
Muito se discutiu à época se o tema era possível, já que o festival é uma marca (pra lá de consolidada) e regulamento proíbe propagandas e menções explícitas a empresas. A Liga acabou fazendo vista grossa e não se pronunciou publicamente. Bem, se o patrocínio esperado chegou ou não, ninguém confirma. Mas a julgar pelo que se viu no desfile da Mocidade… A ajuda prometida passou longe. Quem teve a ingrata missão de materializar o tema foi o carimbado carnavalesco Alexandre Louzada. Adepto de uma estética mais luxuosa e opulenta, o artista ainda tentou imprimir um visual mais ousado para o desfile. Visando driblar a falta de grana, canudos de plásticos foram usados em fantasias e jeans doados revestiram uma das alegorias. Apesar da boa tentativa, os problemas plásticos foram inevitáveis com alegorias bem esquisitas. Assim como várias outras apresentações da lista, o desfile também não foi dos mais agradáveis de se ouvir. A obra musical cantada por Luizinho Andanças era fraca tanto melodicamente quanto em seus versos pouco inspirados. Uma pena! A apresentação passou longe do swing perfeito entre pandeiro e guitarra prometido no samba, gerando um quase rebaixamento.
Acadêmicos da Rocinha 2014 
(Uma nada bucólica viagem à Barra da Tijuca)
Sorria, você está na Barra da Tijuca! Nem só de surtos carnavalescos do Grupo Especial vive essa lista. Se algumas escolas da elite já passam por dificuldades financeiras e administrativas, no grupo de acesso então… Apesar do lado triste dessas questões, algumas agremiações também acabam não se ajudando e escolhendo enredos para lá de problemáticos, que geram sambas ainda mais duvidosos, criando um “milk-shake de desfile” para lá de indigesto. Essa mistura de enredos e sambas ruins somados a problemas gerenciais resultou em quase todos os desfiles dessa lista. E não foi diferente nas bandas da Rocinha. 
Apesar de problemas internos, a tricolor da Zona Sul não vinha de maus carnavais. A parceria com o carnavalesco Luiz Carlos Bruno apostava no bom-humor e gerou desfiles leves e brincalhões, como no ano anterior, cantando a culinária brasileira de forma irreverente. Ao receber a difícil missão de contar a história da Barra da Tijuca, na promessa de uns trocados – de novo!! -, o artista seguiu apostando na linha divertida. O tema não se levou muito a sério ao contar a história do bairro que divide opiniões, lembrando as personagens divertidas, como peruas e madames, além dos shoppings e centros comerciais. Mesmo assim, nem o bom humor ajudou. A falta de grana acabou gerando uma plástica para lá de complicada e quase inacabada em alegorias e fantasias. A trilha sonora, por sua vez, teve letra para lá de trash… Ficamos todos bem lelé da cuca, até hoje se perguntando: sorria, é sério que teve um enredo sobre a Barra da Tijuca?
Unidos de Vila Isabel 2014 
(Retratos de um desfile sem fantasias)
A Vila tá pronta? Apesar do título incontestável com uma das apresentações mais marcantes da década, a azul e branco de Noel mergulhou em período complexo após a conquista do título em 2013. Mais uma vez, problemas de bastidores e gestões duvidosas foram um dos responsáveis por gerar uma apresentação a ser esquecida, ou recordada como exemplo a não ser seguido. Contrariando a máxima que defende que time que estava ganhando não se mexe, a escola mudou quase toda sua equipe responsável pelas boas notas no ano anterior. Saiu Rosa Magalhães, entrou Cid Carvalho. Saiu o coreógrafo Marcelo Misailidis, entrou Alex Neoral. O microfone principal, após anos de Tinga, foi assumido por Gilsinho. Já o casal Rute Alves e Julinho deixou o pavilhão para Marquinhos e Giovanna. Ufa!
A equipe nova estava longe de ser ruim! Nomes premiados do carnaval, já ditos, participaram da construção daquele desfile. No entanto, no pré-carnaval, já era conhecido os maus lençóis em que a Vila se encontrava. A escola gerou muitos comentários por conta de seu barracão atrasado. Até poucas semanas da apresentação, muitas alegorias ainda estavam no ferro. A falta de pagamentos de salários e materiais, inclusive, afastou Cid Carvalho da escola em novembro, quando uma comissão formada por Júnior Schall, Décio Bastos e Júlio Cerqueira foi formada. Após algumas negociações, Cid voltou atrás e em janeiro retomou ao trabalho no barracão. Apesar do empenho do carnavalesco, seu enredo sobre a pluralidade da cultura natural brasileira acabou prejudicado na avenida.
Momentos antes do desfile, a confusão na concentração apontaria para uma apresentação catastrófica. Mesmo após uma longa espera, muitas alas e composições não receberam suas fantasias completas, o que formou alas inteiras que desfilaram de roupas íntimas e macacões de malhas. O mesmo também aconteceu em algumas composições de carros. Nessa confusão, nem mesmo a comissão de frente passou impune. Faltando meia hora da escola entrar na avenida, duas das cinco placas que compunham a apresentação da abertura da escola não haviam chegado. Foram montadas às pressas e algumas falharam nas apresentações para o júri, ao representar xilografias tridimensionais. Tantas tragédias fizeram desse um carnaval que a Vila Isabel quis esquecer. O resultado final foi um 10º lugar. Para muitos, a escola merecia o rebaixamento. De qualquer forma, direções passam e deixam estragos; a força de uma agremiação é eterna. 
Mocidade Independente de Padre Miguel 2016 
(As manchas de um Perlingeirão)
Nota dez? É, talvez não. A Mocidade Independente bem que tentava, mas a crise insistente parecia não querer largar a verde e branco. Mesmo após o afastamento da antiga gestão, a escola não teve sorte na pista. Nem mesmo a contração do badalado carnavalesco Paulo Barros foi suficiente para a realização de um bom desfile. E o azar parecia tanto que, após 2015, o carnavalesco do DNA se mudou para Madureira mesmo após renovar o contrato. Pega de surpresa, a escola da zona oeste recontratou Alexandre Louzada e chamou Edson Pereira para compor a dupla. Quando foram anunciados, os artistas chegaram anunciar um enredo chamado #Alendaimaginação. Entretanto, tempos depois, a direção voltou atrás e acabou lançando um novo tema. A confusão já deu um prenúncio de que o caminho para uma boa posição parecia uma missão árdua. 
A confusa narrativa sugerida por um professor universitário usava a figura de Dom Quixote de La Mancha para fazer uma crítica as “manchas” da história brasileira por intermédio de grandes nomes da literatura brasileira… Entendeu? Bem, poucas pessoas conseguiram. Muito menos os autores do samba-enredo, que nos brindaram com passagens exóticas como “lançados jatos de felicidade”. A promessa de tema crítico acabou sendo esvaziado na também confusa comissão de frente, que, além de muito extensa, fazia críticas ao governo de Dilma Rousseff, endossando o movimento anti-petista da época. Em determinado momento, os corruptos [sic] eram presos com maletas de dinheiro. 
A plástica passeou por altos e baixos, mas foi coroada por um final apoteótico e “inesquecível”. Evidenciando os problemas de barracão, uma alegoria (não) finalizada às pressas na concentração trouxe uma despropositada escultura de Jorge Perlingeiro em meio a um trabalho de péssimo acabamento. Na proposta do enredo rocambolesco, o famoso narrador da apuração deveria dar notas dez para a educação, a saúde e a cultura do país. Era o Brasil que a Mocidade queria. A inusitada ideia serviu para gerar apenas uma das imagens mais esquisitas e aleatórias do carnaval. Um hall frequentando por Perlingeirão, Ieiê do Campinho, Hope e Elis Spock que constitui o museu exótico do carnaval. Não bastasse o trauma para os independentes, o desfile deu início a uma “tradição” de últimas alegorias traumáticas em Padre Miguel. Mais um delírio dividido por todos que vivenciaram o espetáculo.
Beija-Flor 2018 
(Monstro é aquele que não sabe desfilar)
Alguém disse enredo crítico confuso e conduzido por um personagem literário? Apostando na mesma fórmula do enredo da Mocidade supracitado, a Beija-Flor surpreendeu quando anunciou que iria comemorar os duzentos anos de publicação do clássico Frankenstein. A escola pretendia aliar a história em uma narrativa que criticasse o conturbado momento político em que o Brasil vivia (e ainda vive). O que ninguém explicou lá em Nilópolis é que mesmo falando de um dos monstros mais clássicos da literatura, a azul e branco não precisava apresentar tantos monstros também na avenida. Criou um trauma coletivo difícil de ser superado. 
Antes de chegar ao desfile em si, valem algumas linhas sobre os bastidores da apresentação, que marcou a aproximação do herdeiro Gabriel David na direção da escola. O filho de Anísio foi um dos responsáveis pelo rumos escolhidos na ocasião, ao lado de Marcelo Misailidis. O excelente coreógrafo da comissão de frente não apenas sugeriu o enredo como também virou uma espécie de de diretor artístico. Ele comandou as encenações apresentadas durante o desfile. A dupla acabou entrando em atrito com a figura totêmica da Beija-Flor: Laíla. A gente ainda volta a essa história, em outro desfile. Segura aí!
Apesar do enredo frágil e confuso sobre um “monstro que não sabia amar”, esse é o único desfile da lista que não traumatizou também os ouvidos dos sambistas. Elogiado no pré-carnaval, o samba campeão da disputa apostava em um refrão valente e em partes bastantes poéticas para dar conta do tema, impulsionando mais uma vez a sempre aguerrida comunidade nilopolitana. Já que não queremos traumatizar ninguém, não vale aqui relembrar imagens dos desfiles que pareciam ter saído de um noticiário sensacionalista e sanguinário. O que nos cabe analisar foi a “aposta” em uma apresentação mais “cênica”, com grande teatralização e alegorias que contavam com coreografias e mudanças de cenários. O resultado, como já comentamos, foi de imagens estupefatas. A falta de carnavalização do tema e sua crueza estética revelaram um gosto nunca antes visto ou sentido. O desfecho dessa história acabou causando ainda mais danos. Cotada por algumas pessoas para a zona mais baixa da tabela, a Beija-Flor acabou se consagrando campeã em um dos resultados mais injustificáveis e constrangedoras da história. Um delírio coletivo tão grande que é até melhor para nossa sanidade mental fingir que tudo isso nunca existiu. Monstro é aquele que não sabe… desfilar.  
Império Serrano 2019 
(O que foi, o que foi isso?)
Mas e a vida? Se Gonzaguinha perguntou se ela era maravilha ou sofrimento. Restou apenas a segunda opção para o glorioso Império Serrano em um triste capítulo de sua história. Na sua esperada volta ao Grupo Especial, o Reizinho acabou apequenado em meios aos problemas de gestão que o assombravam. Mesmo em 2018, a verde e branco sofreu com a falta de verba e lutou para se apresentar de forma digna no enredo sobre a China. Beneficiada por uma virada de mesa liderada pela Grande Rio, a escola acabou tendo mais uma chance de se apresentar na elite da folia. E sem muita coisa a perder, resolveu partir pro tudo ou nada. Ao contratar Paulo Menezes, o artista sugeriu uma ideia ousada: trocar a disputa de samba-enredo para levar à avenida a famosa canção “O que é, o que é?”, de Gonzaguinha, prometendo fazer toda a arquibancada cantar.
Se medida semelhante causou polêmica em 2015, quando a Viradouro uniu duas obras de Luiz Carlos da Vila, o debate se intensificou ainda mais pelo fato da canção do herdeiro de Gonzagão não ser originalmente um samba em si, além de precisar de um ritmo acelerado demais para se entoado em um cortejo. Balões de oxigênio garantidos para a velha guarda imperiana, a ousadia não parou por aí e acabou chegando no casal de mestre-sala e porta-bandeira. Um tripé, que também serviu a apresentação da comissão de frente, transformou-se no palco para a exibição do casal principal. A geringonça mal acabada e cheia de problemas suspendia a dupla de bailarinos para se apresentar ao júri no alto. Um erro absoluto e constrangedor, que ainda ocorreu sob chuva e forte vento. No desfile, as previsões mais otimistas não se confirmaram. A explosão esperada das arquibancadas ao ouvir o intérprete Leléu cantar a obra musical acabou não acontecendo. Talvez porque o público tenha ficado perplexo com o conjunto visual de péssimo nível, prejudicado pela falta de verbas. Ou ainda pelo andamento aceleradíssimo do samba. Em síntese, foi uma sucessão de erros tão visíveis e inquestionáveis que a apresentação nem repercutiu tanto, na verdade. Simplesmente quase não se falou mais sobre ela, reiterando ainda mais sua posição como delírio coletivo absoluto dos últimos anos. É… a vida!
Beija-Flor 2019 
(Fábulas mal contadas)
Apesar de toda polêmica, o título da Beija-Flor em 2018 acabou balizando o estilo “cênico” como uma aposta que “deu certo”. Assim, Gabriel e Misailidis acabaram ganhando mais espaço na escola para dar sequência aos trabalhos, colocando fim ao histórico casamento de Laíla com a agremiação. Tudo até pareceu melhor quando a equipe criativa escolheu um ótimo tema, em teoria: a comemoração dos 70 anos de fundação da Deusa da Passarela. Entretanto, na busca por “ousar”, o desenvolvimento se perdeu mais uma vez ao criar confusas associações entre a história da escola com as fábulas de Esopo. Se no ano anterior a presença forte de Laíla ajudou na garantia de um bom samba  e de um ótimo desfile de chão, o feito acabou não se repetindo. O quiprocó começou nas disputas. Após anunciar uma parceria campeã na final, a diretoria voltou atrás e optou por uma junção. O samba ficou muito aquém do esperado para uma auto-homenagem.
E o visual? O enredo já confuso resultou em alegorias tão surpreendentes quanto. Mais uma vez, apostas em encenações mal concebidas geraram efeitos que, ao invés de surpreender, constrangeram. Uma das mais aleatórias foi a alegoria da Raposa e das Uvas, a qual relembrava os enredos CEPs (?) da Soberana. Essas e outras associações no  mínimo “curiosas” podem garantir bom entretenimento nas descrições do livro abre-alas. Deixamos aqui essa sugestão. Voltando à apresentação, o que se viu na pista foi mais uma Beija-Flor irreconhecível esteticamente e que passou longe de comer a pista como fizera outrora. Juntando isso com a má repercussão do título no ano anterior, o júri acabou caindo em si e canetando com com olhos mais severos a agremiação. A azul e branco terminou, de forma justa, na pior posição de sua história: um amargo 11º lugar. Diante da comemoração dos seus setenta anos, aos nilopolitanos, um delírio completo para jamais relembrar. 
União da Ilha do Governador 2020 
(Entre becos, ruas, vielas e vasos sanitários)
Essa triste história começa no ponto em que deixamos aquele gancho lá no texto sobre Beija-Flor 2018. A briga em Nilópolis gerou o afastamento de Laíla da agremiação, após fincar seu nome na história nilopolitana. Depois do rompimento, o diretor de carnaval pareceu obstinado em repetir a “fórmula” que havia “dado certo”, talvez buscando reivindicar algum louro por aquela “glória”. Em 2019, quando se dividiu entre a Unidos da Tijuca, no Rio, e a Águia de Ouro, em São Paulo, o sambista já havia conduzido enredos com pitadas críticas e encenações na pista que geraram apresentações duvidosas e longe de boas posições. 
Mudando-se para a União da Ilha, Laíla optou por seguir a mesma linha. Sempre em busca de inovação, resolveu dar um extenso título para o enredo, deixando os compositores livres para desenvolver a obra musical, sem apresentação de uma sinopse. A fórmula acabou não dando certo. Se muitas outras vezes o pulso firme do diretor havia gerado boas obras musicais, não foi o que se viu na ocasião, resultando em uma obra nada elogiada no pré-carnaval. A temporada antes da folia, inclusive, gerou muito boatos sobre a apresentação da tricolor. Imagens surreais que seriam propostas já repercutiram nas redes sociais e algumas delas acabaram se confirmando. A apresentação contou com plástica de mau gosto e a falta de um enredo coerente, que mais pareceu um teste vocacional ao elencar diferentes profissões sem um fio narrativo. Tudo isso ainda foi corado com problemas de evoluções graves, que geraram enormes clarões na pista e uma correria ao final que ainda fez a escola estourar em um minuto o tempo regulamentar.
Se a gente achou que estava livre das apostas “cênicas” e de “críticas sociais” após Beija-Flor 2018, estávamos muito enganados. A sorte é que, diferente do título conquistado dois anos antes, um justo rebaixamento acabou acontecendo. E como filho feio não tem pai, ainda rendeu uma troca de acusações entre a equipe criativa da apresentação, composta ainda por nomes como Cahê Rodrigues e Fran Sérgio. Um verdadeiro salve-se quem puder, tal qual prometia o título do enredo. Apesar de fresco na nossa memória, o desfile que rebaixou a União da Ilha após 11 carnavais ininterruptos no Grupo Especial ainda atormenta alguns sambistas nas madrugadas insones. Aquela alegoria de vasos sanitários realmente existiu? E aquele ônibus que simulava um assalto em plena avenida? Que a passagem de anos nos permita esquecer essas imagens! A nossa torcida é pela recuperação das mais simpática e querida das agremiações cariocas para o próximo carnaval.

Como comentamos no podcast (ouça aqui), esse é o vídeo do maravilhoso anúncio do enredo da escola, que pouco disse apenas com o título genérico, mas que muito animou a comunidade. Com direito a Belo e Gracyanne na plateia, e de pulinhos diversos, confira o registro do enredo que já nasceu pronto:

Menções nada honrosas (?) 
Se há um objetivo em repassar tantas apresentações que o carnaval gostaria de esquecer é o desejo para que desfiles como esses não se repitam. Enredos equivocados, sejam movidos ou não por promessas de patrocínios, sambas de qualidade duvidosa e supostas ousadias que em nada conversaram com a linguagem carnavalesca. Fica a dica. 
A única parte positiva, talvez, sejam os memes que nos divertem. Mas verdade seja dita: queremos é ver todas as escolas brilhando!
E como um Top 10 foi pouco para dar conta das coisas insanas que vimos na Sapucaí nos últimos dez anos, separamos a nossa tradicional lista de menções, que talvez não sejam honrosas, de apresentações que geraram momentos divertidos ou trágicos. Todas elas nos fazem repensar se de fato existiram ou se foram delírios coletivos, compartilhados pelos espectadores na Sapucaí e na transmissão ao vivo por todo país. 
Caprichosos de Pilares 2011 (Gente Humilde)
Estácio de Sá 2012 (Luma de Oliveira)
Renascer de Jacarepaguá 2012 (Romero Britto)
Tradição 2013 (Ieiê do Campinho)
Estação Primeira de Mangueira 2013 (Libélula de Cuiabá)
Mocidade Independente de Padre Miguel 2015 (É de enlouquecer amor)
Caprichosos de Pilares 2016 (É o Pet, é o Pet, é o Pet)
Santa Cruz 2018 (Hope)
Grande Rio 2019 (Quem nunca?)
E aí, o que você mudaria? Qual apresentação você sentiu falta? Conte para nós, por nossas redes sociais, qual seu #TOP10 de delírios coletivos do Rio de Janeiro no período de 2011-2020! Contribua e colabore, sempre, com a #SérieDécada!
Além dos textos com as listas, o #PodcastDoCarnavalize também retorna trazendo os bastidores de cada escolha, das decisões, do que discordamos e concordamos, um dia após a liberação de cada #TOP10! Os membros do Carnavalize, de quarentena, reviram vários desfiles e votaram pelos 10 destaques de sambas, desfiles, comissões de frente, personalidades… É óbvio que não faltou debate! É conteúdo pra ler e ouvir! Se liiiga e carnavalize conosco!

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